Graciela Comparin
Psicóloga, Campo Grande, MS.
Resumo
A depressão é um problema de saúde pública com a mais alta
prevalência entre os transtornos mentais. Os aspectos crônicos e recorrentes do
Transtorno Depressivo Maior afetam de modo negativo a vida do indivíduo, na
dimensão dos seus relacionamentos, na vida familiar, profissional, social, afetiva,
na redução da autoeficácia e da perspectiva negativa para o futuro .
O presente artigo se propõe a fazer uma revisão literária
sobre o Transtorno Depressivo Maior, o seu histórico desde os estudiosos da Grécia antiga até os dias de
hoje, suas definições e classificações, os seus critérios diagnósticos atuais,
os aspectos neurobiológicos e genéticos,
assim como seu tratamento e recuperação clínica e funcional.
Palavras chave: depressão, recuperação clínica, recuperação
funcional.
Abstract
Depression is a public
health problem of higher prevalence among mental disorders. Chronic and
recurrent aspects of Major Depressive Disorder affect negatively the life of
the individual, the size of their relationships, family life, professional,
social, emotional, reducing self-efficacy and the negative outlook for the
future.
This article aims to
make a literature review on the Major Depressive Disorder, its history since
the scholars of ancient Greece to the present day, their definitions and
classifications, their current diagnostic criteria, the neurobiological and
genetic aspects, as well as treatment and functional recovery.
Keywords: depression,
clinical recovery, functional recovery.
Introdução
Estudos mais antigos
sobre o tema depressão/melancolia não foram produzidos pela psiquiatria ou
psicanálise, mas por filósofos e historiadores. Homero descreveu o sofrimento
de Belerofonte perseguido pelos deuses, Aristóteles teorizou sobre o “espírito
melancólico”, Demócrito, o filósofo “louco”, dissecava os animais para neles
encontrar a causa da melancolia do mundo, 1 “essa forma de
deploração perpétua sempre foi, ao mesmo tempo a expressão mais incandescente
de uma rebeldia do pensamento e a manifestação de um desejo.” [*]
Na Antiguidade Grega, Hipócrates sustentava a teoria dos quatro
humores corporais: sangue, fleugma, bílis amarela e bílis negra e o equilíbrio ou desequilíbrio
dessas substâncias responsável pela saúde ou doença do indivíduo. “A melancolia era explicada pela presença de
uma quantidade excessiva e fortuita de bile negra no corpo, e entre os
religiosos da Idade Média era reconhecida como um adoecimento espiritual.”
2
Em seu texto de 1917, Freud, fez um estudo comparativo entre
luto e melancolia e, lançou uma afirmação sobre a origem da depressão, fazendo
a articulação com um estado normal de luto, ou seja, o elo da depressão
melancólica com a “nostalgia de algo que foi perdido (Freud, 1895)”. 3
“Hoje a melancolia
cede lugar à depressão. A psiquiatria introduziu o uso desta palavra que melhor
se aplica a um estado de doença do que a romântica melancolia.” 4
Ao se buscar a distribuição nosográfica desenvolvida pela
psiquiatria no que concerne aos quadros depressivos, podia-se perceber que sua
delimitação se concentrava nos chamados Transtornos do Humor no antigo DSM-IV.
Tal classificação subdividia-se em transtornos depressivos, episódios
depressivos, transtorno distímico, transtorno ciclotímico e transtorno bipolar.
No atual DSM-V, os Transtornos Depressivos ganharam um
capítulo e incluiram transtorno depressivo persistente, transtorno depressivo
maior (incluindo episódio depressivo maior), transtorno disfórico pré-mestrual,
transtorno disruptivo da regulação do humor, transtorno depressivo induzido por
substância/medicamento, transtorno depressivo devido à condição médica,
transtorno depressivo especificado e transtorno depressivo não especificado 5
Objetivos e
fundamentação
Objetivo geral: aprofundar o estudo da depressão e a sua recuperação
clínica e funcional.
Objetivos específicos:
1. Revisar os atuais critérios diagnósticos da depressão do
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais,versão número 5 (DSM-V)
e da Classificação Internacional de Doenças, versão número 10 (CID-10).
2. Discutir os aspectos epidemiológicos e etiológicos da
depressão.
3. Aprofundar as nuances do tratamento multidisciplinar e da
recuperação clínica e funcional da depressão.
Materiais e Métodos
Fez-se uma ampla revisão bibliográfica da
literatura especializada, através de textos publicados entre os anos 1998 e
2015. Foram consultados livros e, também, periódicos selecionados através da
busca nas bases de dados Medline, Lilacs
e Scielo. Os descritores utilizados foram: transtorno depressivo maior,
depressão e recuperação clínica e
funcional da depressão.
Foram encontrados
37 artigos científicos, dos quais 32 foram excluídos do presente estudo, pois,
apesar de abordarem sobre a depressão, não tratavam de temas relacionados ao tratamento multidisciplinar, recuperação clínica e
funcional da depressão.
Foram utilizados 5 artigos e 14 capítulos de
livros. Os critérios de inclusão foram a associação entre os termos buscados e
o Transtorno Depressivo Maior e formas de tratamento e enfrentamento.
Resultados
De
acordo com o DSM-V (2014), o TDM representa a condição clássica desse grupo de
transtornos depressivos.” É caracterizado por episódios distintos de pelo menos
duas semanas de duração, envolvendo alterações na cognição, afeto, funções
neurovegetativas e remissões interepisódicas. O transtorno na maioria dos casos
é recorrente, seu diagnóstico pode ser baseado em um único episódio, sendo
diferenciado da tristeza e do luto normais. O luto leva a grande sofrimento mas
não costuma desencadear um episódio de TDM. 5
Já em
relação ao transtorno depressivo persistente, a distimia, pode ser
diagnosticada quando o transtorno de humor persiste por pelo menos dois anos em
adultos e um ano em crianças. Esta era anteriormente classificada no DSM-IV
como transtorno depressivo crônico. 5
Critérios Diagnósticos do DSM-V
Cinco
(ou mais) dos seguintes sintomas presentes durante o período de duas semanas,
representando uma mudança em relação ao funcionamento anterior: humor deprimido ou
perda de interesse ou prazer.
1.
Humor deprimido na maior parte do dia.
2.
Acentuada diminuição do interesse ou prazer em
atividades na maior parte do dia.
3.
Perda ou ganho de peso sem dieta.
4.
Insônia ou hipersônia quase todos os dias.
5.
Agitação ou retardo psicomotor.
6.
Fadiga ou perda de energia.
7.
Sentimentos ou perda de inutilidade
8.
Capacidade diminuída para pensar ou se
concentrar.
9.
Pensamentos recorrentes de morte.
Características
diagnósticas
Na
prática clínica percebe-se que os mais comuns sinais e sintomas são fadiga,
diminuição da energia, perda de interesse em atividades, retraimento social,
alterações no apetite, podendo comer mais ou em menor quantidade.
Ainda
se encontra sentimento de culpa e desvalia, avaliações negativas do próprio
valor, ruminações a cerca de pequenos fracassos, autorrecriminação, prejuízo na
capacidade de pensar, concentrar-se ou tomar decisões. Sofrimento ou prejuízo
no funcionamento social/profissional do indivíduo.
Verificam-se
muitas mudanças no desempenho funcional dos pacientes. A ansiedade, angústia,
agitação psicomotora, irritabilidade, consumo excessivo de bebidas alcoólicas,
comportamento histriônico, exacerbação de sintomas fóbicos ou hipocondríacos
preexistentes são sintomas associados, que podem mascarar os sintomas
específicos ou configurar depressões atípicas.
O
indivíduo apresenta redução nos níveis de interesse ou desejo sexual, perturbações
do sono podem ocorrer na forma de insônia ou hipersonia. Alterações psicomotoras, como agitação ou
retardo psicomotor, devem ser observáveis por outros, a anamnese objetiva,
coletada com os familiares e amigos auxilia no diagnóstico e prognóstico da
doença.
Os
sintomas devem persistir na maior parte do dia, quase todos os dias, por pelo
menos duas semanas consecutivas. São comuns, também, pensamentos sobre morte,
ideação suicida ou tentativas de suicídio.5 Uma porcentagem
significativa dos depressivos pensa em suicídio, “em dormir para sempre” ou
mesmo que a vida não tem mais sentido. Há de se ter muita cautela e empatia
para se distinguir ideias, planejamentos e tentativas de suicídio, a fim de não
se incorrer em iatrogenias ou mesmo em negligência médica.
Epidemiologia
Estima-se
a presença de depressão entre 3 a 5 % da população geral. Maior ou menor risco
de depressão e a variação de sua prevalência estão associados a diferentes
condições médicas e aos diversos fatores etiológicos. 6
Algumas
doenças endocrinológicas ou cardíacas pode desencadear depressão, assim como,
muitas drogas lícitas e ilícitas.
Segundo
Teng et. al. (2005)* em
populações clínicas este número aumenta, já que a depressão como comorbidade de
doenças clínicas em ambulatório varia de 5 a 10% e é ainda maior para paciente
internados, variando de 9 a 16%, sendo apenas 35 % destes adequadamente
tratados. 6
Os
estudos epidemiológicos da depressão podem ser influenciados por vieses
científicos, como a não procura de atendimento médico por homens, o que difere
das mulheres.
Genética
Os
transtornos depressivos resultam de vários fatores diferentes, de condições
complexas que incluem uma série de variáveis demográficas e estressores vitais
e sociais, além de aspectos genéticos que aumentam a predisposição do indivíduo
para a depressão. Interações desenvolvimentais entre esses eventos resultam em
traços e construtos psicológicos que favorecem pensamentos depressogênicos.7
Mas isto não impede que muitos depressivos desconheçam a existência de
parentes com esta doença.
Fatores
independentes foram associados ao risco de depressão maior, como: dinâmica
familiar, trauma, abuso, estresse, história familiar de psicopatologia e
características de personalidade. Pesquisadores enfatizam a necessidade de uma
abordagem multidisciplinar. Ao longo das últimas três décadas foi dada atenção
ao estudo dos fatores neurobiológicos subjacentes à vulnerabilidade à depressão
maior juntamente com estressores ambientais e individuais.7 Estes podem se constituir em fatores etiológicos,
desencadeantes, perpetuadores ou agravantes.
De
acordo com Sullivan, Neale e Kendler (2000) * todos os estudos familiares
duplo-cegos e controlados encontraram taxas mais elevadas de depressão maior
entre parentes afetados em comparação com parentes de controles normais, sendo
a taxa duas vezes maior nos parentes de primeiro grau de pacientes deprimidos
quando comparados a parentes de controles, também de primeiro grau. 7 A hereditariedade da depressão é de 33
a 50% (Levinson, 2006) e, provavelmente, envolva
múltiplos genes importantes nas interações genético-ambientais. 8
Vários genes envolvidos na função das
monoaminas têm sido implicados na vulnerabilidade à depressão (Levinson, 2006) (...)
uma das constatações em estudos genéticos “foi a taxa aumentada de depressão em
indivíduos com uma forma ineficiente de transportador de serotonina (...) que
também foram expostos a eventos estressantes da vida” (Caspi et. al. 2003; Kendler et. al., 2005). Daí a necessidade da
abordagem diagnóstica e prognóstica ser bio-psico-sócio-ambiental, histórica,
cultural e religiosa.
Aspectos Neurobiológicos da Depressão
“O
fenômeno depressivo tem como substrato biológico uma série de eventos de desorganização
da bioquímica cerebral ainda que parcialmente conhecidos.” 9 A hipótese anti-depressiva baseia-se em
aumento imediato da serotonina, noradrenalina e dopamina na sinapse, vários
modelos têm enfatizado o papel de monoaminas na depressão e na reposta ao
tratamento. 9 Alguns agentes melatoninérgicos também têm feito um
importante papel no tratamento da depressão.
Após o
início do tratamento com antidepressivos, muito embora ocorra elevação quase
imediata dos níveis de monoaminas na fenda sináptica, o efeito terapêutico é
lento e a taxa de remissão esperada que esses medicamentos alcançam raramente
excedem 50 %. Os benefícios terapêuticos podem ocorrer nas duas primeiras
semanas, com alguma melhora já nos três primeiros dias.9 Alguns
pacientes possuem uma farmacocinética diferente com os antidepressivos, porém,
mesmo assim, estes prazos não são diferentes.
Apesar de todos os avanços já registrados com
medicamentos antidepressivos – principalmente inibidores seletivos de recaptação
de serotonina e noradrenalina (ISRS e ISRSN), várias necessidades clínicas
ainda não são atendidas por esses tratamentos e outros disponíveis, eficazes no
tratamento de quadros refratários, melhora dos sintomas cognitivos, início de
ação mais rápido, melhora de efeitos colaterais, como: disfunção sexual,
efeitos gastrointestinais, alteração do apetite e consequente ganho ou perda de
peso. 10
Tratamento Multidisciplinar da Depressão
A
predição do curso futuro de uma doença, após sua instalação, as decisões sobre
os tratamentos e os procedimentos devem estar baseados em estudos de
prognóstico.
O
prognóstico da depressão depende de um diagnóstico o mais precoce e adequado
possível, assim como da prescrição de um tratamento global e individualizado,
sistêmico e dinâmico. O tratamento de manutenção precisa ser contínuo e bem
acurado, com uma boa relação médico-paciente e toda a equipe multidisciplinar
envolvida.
No amplo, individualizado e complexo
diagnóstico da depressão há de se levar em conta a subjetividade humana e suas
nuances biológicas, psicológicas, sociais, ambientais, históricas, culturais e
religiosas (no sentido também de crenças). Além disto, deve-se ter em mente
que, todo e qualquer indivíduo, dependendo das circunstâncias em que se
encontre, o mesmo pode estar predisposto a falar a verdade, mentir, omitir,
exagerar e/ou amenizar sobre os seus sentimentos, comportamentos e emoções.
Estes últimos que podem ser manifestados por dados verbais, também chamados de
introspectivos, e dados não verbais ou inspectivos.
Com
a ampla divulgação da depressão na imprensa e na mídia falada, escrita,
televisionada e virtual, muitas pessoas se deixam ser influenciadas por
quaisquer informações; não tão consistentes e científicas a ponto de lhes serem
úteis e eficazes. Por conta disto, há muitos atrasos no diagnóstico, no início
e na adesão ao tratamento, o que vem a interferir no prognóstico do quadro
clínico.
“O
sucesso do tratamento dos pacientes com transtorno depressivo maior é promovido
por uma avaliação diagnóstica inicial completa. O tratamento consiste de uma
fase inicial de 6 a 8 semanas, quando a remissão é induzida.” 11
Essa
avaliação deve conter a história da doença atual; a história psiquiátrica,
incluindo tratamentos e respostas a tratamentos anteriores; a história médica
geral e a de transtornos por uso de substâncias; história pessoal, sócia e
familiar; exame dos estado mental e físico; testes diagnósticos conforme
indicado. 12
Deve
ser feita também uma cuidadosa avaliação de risco de suicídio e ideação
suicida. Pessoas que parecem possuir ideação ou planos suicidas ou homicidas
requerem monitoração rigorosa, (...) no entanto, deve-se considerar que é
difícil prever tentativas de suicídio e suicídio consumado. 12
“Na
fase aguda, além do tratamento psiquiátrico, o médico pode escolher entre
várias modalidades de tratamento inicial, incluindo farmacoterapia,
psicoterapia ou a combinação de medicamentos e psicoterapia.” 12
No
atendimento psicoterápico percebe-se que o paciente só responderá bem à terapia
após o início do tratamento farmacológico, quando o paciente já tiver
recuperado parte de suas funções cognitivas e for capaz de fazer associações de
ideias, responder a estímulos, responder à intervenção no sentido que haja
mudanças tanto emocionais quanto comportamentais.
“Ensaios clínicos mostram que o tratamento
farmacológico combinado com psicoterapia tem apresentado resultados mais
eficientes na redução e prevenção do reaparecimento de episódios de depressão,
do que aqueles apenas medicamentosos (Fleck & Horwath, 2005; Hollon et al.,
2005 .” 13
Também
a eletroconvulsoterapia (ECT) tem
sido usada em pacientes com TDM com alto nível de gravidade de sintomas e
prejuízo funcional, bem como em casos nos quais sintomas psicóticos ou
catatonia estão presentes. Também em pacientes com necessidade urgente de
resposta, como suicidas ou que se recusam a comer ou, ainda, em condições
médicas comórbidas que impedem o uso de medicamentos antidepressivos. 12
Pode-se
dizer que a taxa de resposta à ECT quando utilizada para pacientes
não-refratários é de 80 a 90%. Para os refratários a taxa diminui para para 50
a 60%.Desde a sua introdução no
início da década de 1930, a ECT teve um importante desenvolvimento ao ser usada
conjuntamente com anestesias e relaxantes musculares que permitiam maior
segurança e aceitação.
Depressão em neurologia
A depressão é uma síndrome que pode causar alterações nas
funções cognitivas dos pacientes, o que leva à necessidade de um diagnóstico
diferencial. (Rozenthal et al., 2004).
Os estados neurológicos gerados pela depressão podem, muitas vezes, confundirem-se
com quadros neurológicos, pela semelhança da disfuncionalidade. 9
“Pacientes com
depressão atendem formalmente aos critérios para diagnósticos de demência [...]
a presença de depressão na terceira idade é uma fator preditor para ocorrência
de tal quadro neurológico posteriormente.”9
A perda cognitiva provocada pela depressão reflete-se em anormalidades
envolvendo principalmente memória e atenção, podendo incluir função executiva,
velocidade psicomotora, raciocínio não verbal e novas aprendizagens.14
“Contudo, a disfunção neurocomportamental associada ao Transtorno Depressivo
Maior parece depender de diferenças individuais, com somente alguns indivíduos
deprimidos demonstrando comprometimento.”14
Na avaliação neuropsicológica de
pacientes deprimidos, áreas cognitivas mais afetadas são: evocação após
intervalo de tempo, aquisição da memória, atenção, concentração, flexibilidade
cognitiva e abstração (Zakzanis, Leach e Kaplan, 1999).
Entretanto, é importante ressaltar que nem todos os pacientes deprimidos
apresentam estes déficits. Estudos demonstraram que os déficits de memória
associados à depressão são similares aos de pacientes com disfunção subcortical
(por exemplo, doença de Hungtington) (Laks et al, 1999).
A área cerebral mais estudada tem sido a região frontal e suas
conexões, isso explica a presença de sintomas disexecutivos em pacientes com
TDM, como dificuldades em tarefas de resolução de problemas, tomada de
decisões.13
“Outra importante função das áreas das áreas frontais é a modulação
de estruturas límbicas e do tronco encefálico, as quais coordenam os
comportamentos emocionais, o que vem incluir sintomas como a inibição e, a
queda de volição e a apatia.”
Cerca de 30 a 50 % dos pacientes deprimidos não se recuperam mais da
depressão, o que vale também para alguns déficits cognitivos que persistem após
a remissão da doença, bem como, algumas anormalidades neuroatômicas após a
melhora do quadro. 13
Porém deve-se levar em consideração que os dados estatísticos não
podem ser considerados como empecilhos para um tratamento o mais otimista
possível.
Recuperação clínica e funcional da Depressão
O
conceito ampliado de funcionalidade abrange diferentes domínios onde estão
incluídas áreas como trabalho (a capacidade de executar tarefas e atividades
relacionadas ao trabalho), cuidados pessoais, funcionalidade social, a família
e a área cognitiva.15
Trata-se
da capacidade de executar atividades ou funções da forma esperada ou
necessária. Assim, a funcionalidade social tem sido definida como "a
capacidade de um indivíduo para cumprir e executar uma função social normal
" ou" interação do indivíduo com o seu meio ambiente e a capacidade
de exercer o seu papel dentro dele ".
“A melhora funcional
é o objetivo a se obter com o tratamento
da depressão maior. [...] O DSM V define
remissão como a ausência de sintomas e sinais significativos por um período prolongado.
Na prática, a remissão é frequentemente conceitualizada como a ausência de
sintomas por ao menos 3 meses.” 16
A remissão também pode
ser vista, na prática clínica, dependendo do paciente, pela ausência de humor
depressivo e ausência de perda de interesse durante pelo menos 3 semanas, com
não mais de 3 dos restantes sintomas depressivos.
“Cerca de 30 a 60% dos estados depressivos são
resistentes aos tratamentos habituais, estes não remitem após a primeira
tentativa de tratamento. O STAR*D(*) mostrou que 50% dos
pacientes chegam à remissão com uma segunda tentativa, seja pela troca do
medicamento ou por meio de estratégias de combinação [...] as chances de
remissão diminuem à medida que aumenta o número de tentativas prévias
malsucedidas.10 ”
Apesar dos grandes esforços em pesquisa para se chegar a um
entendimento da base biológica e genética do TDM e outros transtornos, a psicofarmacologia
ainda não trouxe uma solução completa para os transtonos mentais graves. 17
São comuns os fracassos de tratamentos, sintomas residuais e
recorrências. “O índice de remissão para o tratamento de depressão maior varia
de cerca de 37 a 13%, dependendo da
medicação tentada anteriormente.” *
Outro fator a ser considerado
é o estresse. “Estudos relacionaram o estresse
com um atraso estatisticamente significativo na recuperação funcional
após a recuperação clínica, que varia de 26 dias em relação ao funcionamento familiar,
a 58 dias em relação aos relacionamentos sociais, e 112 dias com relação ao trabalho
/ escola”. 18
O eixo
hipotalâmico-hipofisário-adrenal (HHA), é o principal responsável pela resposta
do organismo a um estímulo estressor. A hiperatividade deste eixo na depressão
é um dos achados mais consistentes da psiquiatria. Pacientes com transtorno depressivo
apresentam concentrações aumentadas de cortisol no plasma, na urina, no liquido
cérebro-espinhal, aumento das glândulas adrenais e hipófise. 10 Apesar
das evidências que associam o estresse à depressão, nem todos os pacientes com depressão
apresentam estas alterações.
“O tratamento farmacológico, apesar de
prioritário, algumas vezes não é suficiente para uma recuperação completa
(sintomática e funcional) do paciente e as abordagens psicossociais têm
demonstrado cada vez mais sua eficácia na melhora destes fatores e na obtenção
de uma melhor qualidade de vida ao longo do tratamento.” 16
“ A
Psicoeducação, através de matérias jornalísticas folhetos explicativos, blogs, entre outros, tem sido cada vez mais utilizada como coadjuvante
no tratamento de diversos transtornos psiquiátricos e sua eficácia no tratamento
da depressão também já foi bem estabelecida.”19. Com o avanço
tecnológico e a globalização das informações em todas as áreas, incluindo a
depressão, as pessoas procuram se informar em diversos meios impressos e
eletrônicos, porém nem sempre confiáveis. Há relatos, inclusive, de páginas na
rede internacional de computadores (internet)
ensinando como a pessoa pode se suicidar. Daí a necessidade premente dos
profissionais de saúde discutirem com os seus pacientes quais são os seus
conhecimentos prévios sobre a sua enfermidade, a fim de dirimirem dúvidas e
corrigirem os mitos ou as informações por vezes equivocadas. A Medicina e as
outras áreas da saúde necessitam estar cada vez mais socializadas e
interligadas com as tecnologias da informação.
Os grupos de apoio, como a Associação Brasileira
de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA), cada vez
mais têm se expandido e se consolidado com a missão de trocar informações
e experiências, buscar soluções, dar
conforto uns aos outros e possibilitar o desenvolvimento do sentimento de
pertencimento, informar e educar a sociedade sobre a natureza dos
transtornos afetivos.Além de apoiar psicossocialmente os portadores de
depressão, transtorno bipolar, seus familiares e amigos.
O objetivo final do cuidado do paciente deve ser
sua reintegração à sociedade, por meio de uma vida produtiva, juntamente ao
tratamento dos sintomas da doença.16
Há de se verificar as suas estratégias de enfrentamento do
problemas.
Muitas pessoas, diante de eventos traumáticos e
estressantes, procuram o apoio profissional, enquanto outras enfatizam o
problema ou a vitimização. A esta variedade individual de processamento da
memória com relação ao fator estressor dá-se o nome de resiliência. As formas
de enfrentamento de cada paciente se diferem individualmente, assim como o conjunto das estratégias utilizadas para
adaptação às circunstâncias adversas.
A terapia cognitiva associada a técnicas
comportamentais (TCC) e o tratamento
farmacológico, têm se mostrado um importante recurso de enfretamento da doença. A objetividade da
TCC e o papel ativo do paciente tendem a favorecer a remissão dos sintomas e a
prevenção de recaídas, tendo como objetivo a redução do sofrimento causado pelos
episódios depressivos. 10
A maior parte das terapias, inclusive a TCC, pode
ter de aguardar até que as emoções se acalmem. Quando as emoções estão
alteradas pode ser especialmente difícil utilizar técnicas cognitvas
tradicionais de reestruturação, causando, assim, mais estresse ao paciente. Na
prática clínica, percebe-se que a experiência mais problemática para os
pacientes é a sensação de estarem sendo dominados pela emoção e não saberem
lidar com este sentimento. Muitas vezes adotam comportamentos problemáticos
como: abuso de álcool e drogas, ruminações, autorecriminações, compulsação
alimentar, comportamento sexual/pornográfico compulsivo, responsabilização de
outras pessoas, ou seja, estratégias autodestrutivas.
Desenvolver habilidades de regulação emocional
pode ajudar estes pacientes a aprender novas formas de pensamentos e
comportamentos, por conseguinte novas reações, mais adequadas frente ao
sofrimento.
Discussão e Conclusões
Na nossa prática clínica, no que tange à hereditariedade,
a relação familiar se comprova ao atendermos indivíduos pertencentes a famílias
com histórico de depressão maior que se repete, às vezes, por gerações.
Quanto aos déficits cognitivos há um limite
tênue, haja vista que, em muitos casos, dependerá mais do paciente em buscar
soluções como: treino cognitivo e exercícios que promovam a estimulação das
funções cognitivas do que o próprio tratamento.
O tratamento farmacológico associado a
psicoterapia como melhor recurso de enfrentamento também fica comprovado na
prática clínica.
O objetivo do tratamento é a recuperação do
paciente para que este tenha uma vida produtiva, reintegrado à sociedade e em
sua relações interpessoais com melhor qualidade de vida possível.
A
alta prevalência da depressão leva os indivíduos deprimidos à procura dos
serviços de saúde. É digno de nota a necessidade de maior atenção no
planejamento de políticas públicas de saúde voltadas para tais condições. A
assistência médica destes indivíduos, por sua característica intermitente e de
longo prazo, gera altos custos financeiros e prejudica o desempenho da
atividade profissional e social dos pacientes.
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