Reação de Dor e Aflição Prolongadas
Este
estado pode se manifestar por qualquer etapa da seqüência: protesto, desespero
e desinteresse.
1. A
criança chora, chama e busca ao progenitor ausente, recusando quaisquer
tentativas
de consolo por outras pessoas.
2.
Retraimento emocional que se manifesta por letargia, expressão facial de
tristeza
e falta de interesse nas atividades apropriadas para a idade.
3.
Desorganização dos horários de comer e dormir.
4.
Regressão ou perda de hábitos já adquiridos, como por exemplo, fazer xixi e/ou
cocô na roupa (ou cama), falar como se fosse mais novo.
5.
Desinteresse paradoxal, que se manifesta por indiferença às recordações da
figura cuidadora (fotografia ou menção do nome), ou mesmo uma espécie de
"ouvido seletivo", que parece não reconhecer essas pessoas.
6.
Como comportamento alternativo, a criança pode mostrar-se exatamente ao
contrário das características acima; torna-se extremamente sensível a qualquer
recordação do(a) cuidador(a), apresentando mal estar agudo diante de qualquer
estímulo que lembre a pessoa.
Sobre
o estabelecimento dos vínculos, Winnicott (2) diz que: "Sem ter alguém
dedicado especificamente às suas necessidades, o bebê não consegue stabelecer
uma relação eficiente com o mundo externo. Sem alguém para dar-lhe
gratificações instintivas e satisfatórias, o bebê não consegue descobrir seu
próprio corpo nem desenvolver uma personalidade integrada".
Alguns
estudos sobre alterações psicoemocionais detectadas em crianças de orfanato,
nem sempre acabam apontando um diagnóstico perfeitamente definido pelas
classificações internacionais (CID.10 e DSM.IV). Foi de Laurie Miller, a
seguinte observação: "Vi um menino que ficou num orfanato russo até os 2
anos e meio de idade e depois foi adotado por uma mãe solteira nos Estados
Unidos. Cada médico que o atendeu fez um diagnóstico diferente: esquizofrenia,
autismo, desordem obssessivo compulsiva.
Cada um continha um pouco de verdade.
Meu diagnóstico seria de complexa disfunção comportamental
neurofisiológica de criança pós-institucionalizada.
Alguns psicólogos dão a esses pequenos pacientes o
diagnóstico de Desordem do Vínculo, definindo um grupo de manifestações apresentadas por parte
das crianças desses estabelecimentos asilares. Esse, entretanto, não é um
diagnóstico médico listado na CID.10, mas nem por isso deixa de existir.
A negligência é entendida, moral e juridicamente,
como um tipo de violência onde o agressor é passivo, e a agressão acontece
justamente pela falta de ação; portanto é muitas vezes é tida como menos
importante. A mãe ou pai negligente é culpado mais pelo que não fez.
Em
Psiquiatria Forense, ao se estudar a Violência de um modo geral, onde se inclui
a Negligência Infantil, costuma-se diferenciar essa Negligência em 2 tipos:
Negligência
Física e a Psicológica.
Por
razões lógicas (e práticas) não carecemos dessa distinção, supondo que ambas
costumam ser indissolúveis e inseparáveis.
Teoria do vínculo
A
chamada Teoria do Vínculo ou da Ligação Afetiva (preferimos esta última), diz
respeito à necessidade de amor materno, ou algo bem parecido com isso, para as
crianças se desenvolverem bem emocional e cognitivamente. Essa ligação
criança-mãe precisa, segundo especialistas, de uma importante continuidade de
cuidado afetivo para ser eficaz.
Se o
cuidado afetivo contínuo será fornecido principalmente por uma mãe, o que se
pergunta com preocupação, é se um orfanato ou uma creche seria ou não uma
espécie de descontinuidade no processo do vínculo. Os primeiros estudos sobre
a ligação afetiva foram publicados pelo psiquiatra inglês John Bowlby e pelo
francês René Spitz, e mostraram um impressionante comprometimento nas reações
psicológicas e físicas das crianças separadas de seus pais quando muito jovens.
Hoje em dia, quando as separações entre mães e
filhos são parte dos problemas da vida moderna e independentes da orfandade,
seja pelas necessidades do trabalho feminino, seja pela alta incidência de mães
solteiras sem possibilidades de ficar com o filho, seja por acontecimentos
catastróficos internacionais (guerras, terremotos, etc.), a comunidade
científica quer saber mais sobre o que acontece com essas crianças cujos laços
afetivos se romperam.
Fora
a questão dos orfanatos, que parece ser pior, alguns terapeutas arriscam
teorias segundo as quais, mesmo as creches, especialmente quando não são de boa
qualidade, assim como a volta da mãe ao trabalho alguns meses após o parto, são
fatores de grande risco para o desenvolvimento de desordens do vínculo (tipo Vínculo Inseguro, veja adiante). Pode-se,
possivelmente, considerar as crianças pequenas que passam muitas horas em
creches de baixa qualidade, e/ou que têm um grupo irregular de substitutos
maternos durante seus primeiros anos de vida como fator fortemente agravante.
Desordem do Vínculo
A
vida em orfanatos tende a inibir as áreas da inteligência nas crianças de uma
forma global, interferindo negativamente na coordenação motora geral, na
interação social e na linguagem. Bons estudos foram realizados no Canadá por
Elinor Ames, e revelaram que 78% das crianças romenas provenientes de orfanato
estavam atrasadas quando foram adotadas. Por carência de estimulação, de vínculos afetivos e de atenção emocional,
as crianças de orfanatos podem ter deficiências cognitivas, deficiências de
integração sensorial, dificuldade em processar a linguagem no ritmo em que é
falada e, conseqüentemente, prejuízo no processo de aprendizado.
Victor
Groza (3), um dos maiores especialistas em adoção, num estudo de mais de 200
famílias norte-americanas que adotaram crianças romenas, dividiu os adotados em
três grupos. Em seu estudo, cerca de 20% dos adotados eram o que ele chamou de "Crianças Prejudicadas", ou
seja, crianças que foram muito afetadas pela institucionalização em orfanatos. Essas crianças continuaram tendo problemas
emocionais e de desenvolvimento até quatro anos após sua adoção.
O
estudo não foi suficientemente longo para acompanhar essas crianças depois de 4
anos de adotadas. Cerca de 60% dessas crianças ele chamou de "maravilhas
feridas". Elas apresentavam um atraso de sociabilidade e de
desenvolvimento em relação aos colegas, mas, apesar disso, conseguiram
readquirir uma boa adaptação e desenvolvimento em seus lares adotivos.
Finalmente, refere um terceiro grupo representado por crianças sem nenhum
efeito prejudicial produzido pelos orfanatos. Talvez, especula Groza, essas
crianças fossem um tipo de "mascote" no orfanato e, com sorte,
conseguiram fazer com que lhes fosse dispensado mais atenção.
Por
causa do grupo "Crianças Prejudicadas", Groza alerta que, ao adotar,
é preciso estar preparado para alguém com necessidades especiais, necessidades
estas que podem durar uma vida inteira. De qualquer forma, observou quer, entre
as crianças deixadas em orfanatos e aquelas prontamente adotadas, estas últimas
evoluem muito melhor. Mas porque a chamada Negligência Precoce afeta mais
algumas crianças que outras?
A
resposta pode ser tentada nos trabalhos de Jerome Kagan, de Harvard. Ao mesmo
tempo em que ele que aceita a teoria do vínculo como sendo bastante atraente,
reconhece ser muito difícil e subjetivo medir o conteúdo emocional dos
relacionamentos entre as diferentes pessoas. O temperamento inato (natureza da
criança), diz Kagan, é tão importante para determinar se um bebê se
transformará num adulto feliz, seguro ou sofredor, quanto às primeiras
experiências afetivas.
Algumas
crianças são simplesmente mais suscetíveis à separação e à perda do que outras.
O
Novo Vínculo Familiar
Em
relação à capacidade da criança adotada formar vínculo afetivo com a nova
família, Elinor Ames concluiu que todas as crianças da amostra pesquisada por
ela formara algum tipo de vínculo com a
família da adoção. A suspeita de que tais
crianças
pudessem elaborar um padrão de vínculo inseguro foi despertado pela observação
de que, mesmo três anos depois da adoção, 60% dos pais notavam uma atitude
excessivamente amigável de seus filhos para com adultos estranhos. Por outro
lado, O’Connor comparou dois grupos de crianças adotadas, um deles considerado
de risco genético, tomando por base o perfil de personalidade de seus pais
biológicos, e outro sem risco genético. Concluiu que as crianças com risco
genético têm muito mais probabilidade de
desenvolver problemas comportamentais que o outro, dificultando assim a
adaptação à adoção .
Mas,
sem dúvida, van der Valk (1998) é um dos autores que melhor têm pesquisado as
influências genéticas na qualidade da adoção. Segundo ele, estudando e
acompanhando por 15 anos a adoção de 229 pares de irmãos por famílias
diferentes e 1080 adoções únicas, mais de 50% dos problemas de agressividade,
atenção e sociabilidade puderam ser atribuído a problemas genéticos, enquanto
40% desses problemas podem ser explicado através de variantes ambientais .
E entre as variantes ambientais capazes de
comprometer a qualidade da adoção, Derdeyn (1998), além de relacionar uma série
delas muito variável, atribui também à conotação cultural pejorativa da adoção
um elemento importante a influenciar essa qualidade. Haveria certa
predisposição da família e da sociedade suficiente para superestimar eventuais
problemas na criança adotiva.
Uma
das seqüelas da criança de orfanato diz respeito à graduação ou nível em que
estabelece vínculos íntimos com outras pessoas. Alguns, por um padrão de Vínculo Inseguro, costumam ser
exageradamente amigáveis com todos que se aproximam, como se tentassem atrair a
companhia e de alguém que lhes desse mais segurança, outros, ao contrário,
parecem evitar qualquer aproximação mais calorosa, como se tivessem medo da
decepção.
Essas
crianças parece que sentem a falta de pessoas particularmente sintonizadas com
elas e, apesar disso não produzir necessariamente um evidente distúrbio de
vínculo, pode fazer com que elas oscilem para mais (vínculo inseguro) ou para
menos (vínculo embotado).
Hughes
(1999) apresenta uma nova proposta para melhorar os problemas de adoção.
Ele
recomenda que os problemas de vínculo sejam previamente estudados e detalhados
para, a partir desse conhecimento, elaborar-se condutas dos pais adotivos,
consoantes aos roblemas do vínculo. Na
realidade ele faz o contrário do que se tem feito até agora, ou seja, ele não
espera haver problemas de vínculo para agir nas crianças, mas parte do
pressuposto de que, de fato, algum problema de vínculo existe e procura adequar
os pais adotivos a esse problem.
Para
uma criança muito nova, pode ser prejudicial à falta de ligação afetiva com uma
pessoa que conviva com ela. Segundo a
teoria de John Bowlby (8), a privação prolongada de cuidados maternos para uma
criança muito nova pode causar efeitos de graves conseqüências no caráter,
efeitos esses que podem se prolongar por toda a sua vida futura. E isso
tanto se relaciona a crianças de orfanato, àquelas que sofrem separações dos pais, ou mesmo para aquelas
que, apesar de viverem em seus lares, são
abandonadas por negligência ou omissão.
Este
último caso é quando a mãe se encontra fisicamente presente e emocionalmente
distante.
Muitos
acreditam que atender imediatamente a um choro de bebê pode transformá-lo numa
criança mimada, mas, por outro lado, sabe-se que nenhum tipo de cuidado
infantil acompanhado de carinho materno poderá resultar em insegurança.
Elementos genéticos
Um estudo realizado pela psiquiatra Susane Rocha de
Abreu , como dissertação de mestrado, mostrou que as crianças e adolescentes
que moram em orfanatos têm seis vezes mais chance de desenvolver transtornos
psiquiátricos do que as que vivem com suas famílias. Os orfanatos diferem de instituições
destinadas à correção de delinqüentes, caso da maior parte das unidades da
FEBEM.
O
estudo de Susane comparou crianças institucionalizadas com crianças que moravam
com a família: enquanto, em média, 49% das crianças que moravam em instituições
apresentavam algum tipo de transtorno psiquiátrico, eles foram encontrados em
14,3% das que viviam com a família.
O transtorno encontrado com mais freqüência em ambos
os casos foi depressão. No grupo do
orfanato, 28,6% tinham a doença, contra cerca de 8% dos adolescentes que moravam
com a família. Em segundo lugar foi a Deficiência (Retardo) Mental Leve, encontrada em 11%
das crianças dos orfanatos, contra 6,3% das que viviam em ambiente
familiar.
Com menos freqüência, a Hiperatividade (4,8%) foi
detectada apenas entre as crianças moradoras dos orfanatos, assim como a
ansiedade (3,2%) e os Transtornos de Conduta, também só nos
institucionalizados, com 1,6%, associado à delinqüência e à desobediência.
O
trabalho conclui que viver em uma instituição está associado à maior chance de
apresentar problemas psiquiátricos e o desempenho escolar prejudicado, mesmo
considerando a influência de outros fatores como, por exemplo, a ausência da
mãe (por morte ou desaparecimento). Aliás, 62% dos internos estavam atrasados
ao menos um ano em relação à série esperada para crianças de suas idades.
Nenhum comentário:
Postar um comentário