conceitos fundamentais, processo
de separação e individuação
Margaret Mahler identificou diferentes
fases no processo do desenvolvimento psicológico do bebê (Mahler, 1968, 1975),
sendo a primeira, a do narcisismo primário na qual uma fase ‘autística normal’
marcaria as duas primeiras semanas de vida do bebê.
Essa fase se caracterizaria por um estado de desorientação alucinatória primitiva (narcisismo primário absoluto), ocorrendo uma falta de consciência do agente materno. Na fase seguinte do narcisimo primário (onipotência alucinatória condicional) haveria uma consciência de que a satisfação das necessidades viria de algum lugar externo ao eu.
A partir do segundo mês de vida, essa consciência,
inicialmente ‘turva’ torna-se difusa, marcando o início da fase de simbiose
normal – o bebê funciona como se ele e sua mãe fossem uma unidade dual. É
dentro desse quadro de total dependência psicológica e sociobiológica da mãe
que o ego rudimentar do bebê pequeno começa um processo de diferenciação. Por
volta dos seis meses de idade, teria início a fase de separação-individuação
que levará à organização do indivíduo.
Mahler (1968) desenvolveu suas idéias sobre os autismos infantis a partir de sua teoria evolutiva, explicando o autismo como sendo um subgrupo das psicoses infantis e uma regressão ou fixação a uma fase inicial do desenvolvimento de não-diferenciação perceptiva, na qual os sintomas que mais se destacam são as dificuldades em integrar sensações vindas do mundo externo e interno, e em perceber a mãe na qualidade de representante do mundo exterior.
Mahler (1968) desenvolveu suas idéias sobre os autismos infantis a partir de sua teoria evolutiva, explicando o autismo como sendo um subgrupo das psicoses infantis e uma regressão ou fixação a uma fase inicial do desenvolvimento de não-diferenciação perceptiva, na qual os sintomas que mais se destacam são as dificuldades em integrar sensações vindas do mundo externo e interno, e em perceber a mãe na qualidade de representante do mundo exterior.
É interessante observar que, de acordo com a concepção de
Margaret Mahler sobre o desenvolvimento infantil normal, o bebê atravessa
inicialmente uma fase “autista normal”, na qual o objetivo principal é a
aquisição do equilíbrio homeostático através de mecanismos somatopsíquicos e
fisiológicos. A seguir, na fase “simbiótica normal”, o bebê funciona como se
ele e sua mãe fossem uma unidade dual onipotente dentro de uma fronteira comum.
Estas duas fases iniciais são consideradas pré-requisitos indispensáveis para o
estabelecimento do processo normal de separação- individuação, que compreende
quatro subfases e culmina no momento em que a criança já percebe a mãe como uma
pessoa separada no mundo externo, e também fazendo parte do seu mundo de
representação interna, passando a se interessar progressivamente por jogos e
buscando o contato com pares e outros adultos.
O desenvolvimento normal implica em dificuldades que,
para serem ultrapassadas, exigem um determinado posicionamento materno. Segundo
Mahler, a disponibilidade da mãe para acompanhar o desenvolvimento da criança,
adaptando-se às suas necessidades e reconhecendo suas dificuldades e conflitos,
é crucial para que ela possa adquirir sua individualidade
Segundo Roudinesco (1998), A psicanalista húngara
Margaret Schönberger Mahler dedicou-se à etiologia das psicoses e ao autismo,
publicando várias obras sobre esse tema, e embora fosse marcada pelos trabalhos
de Melanie Klein, inspirou-se em Winnicott, apesar de intitular-se fiel à
corrente annafreudiana e às teses da psicologia do ego, ou seja, —... à
tradição vienense da psicanálise, acusando os kleinianos por seu dogmatismo e
seus excessos de imaginação, que os levavam, dizia ela, a inventar uma vida
fantástica para o lactente“ ( Roudinesco, 1998, p. 484). As observações clínicas de Margaret Mahler (1983) orientaram-na a
criar um modelo de desenvolvimento psíquico do ser humano, que incluem: Uma fase
autista, à qual ficam fixadas as crianças com psicose deste tipo; uma fase
simbiótica, à qual regridem as crianças com Síndrome de Psicose Simbiótica; e
uma fase de separação e individuação, que o indivíduo normal percorre para
obter sua identidade. Este modelo tem sido empregado para explicar tanto os
aspectos do desenvolvimento normal, como os da psicopatologia. —... nessa fase
autista normal que se estende desde o nascimento até o segundo mês de vida mais
ou menos, o bebê não distingue entre realidade interna e externa, nem parece
distinguir entre ele mesmo e os objetos
inanimados ao seu redor. Ao dirigir-se gradativamente para a fase
simbiótica, o bebê torna-se vagamente consciente de que o alívio para a tensão
de fome instintual vem do mundo externo, enquanto o doloroso acúmulo de tensão
nasce dentro dele. No entanto, para haver este reconhecimento é necessário que
aconteça, durante a fase simbiótica, alguma diferenciação do ego rudimentar“
(Mahler,1983, p.45).
Existe um fator inato, constitutivo do ser humano que o
leva ao processo de separação e individuação. A esse processo Mahler chamou de fase de separação e individuação, onde a
criança precisa passar antes com êxito por outras duas fases: a autista normal
e a simbiótica normal, para ingressar na mesma.
Próximo aos cinco meses de idade inicia-se um processo
pelo qual a criança começa a perceber não apenas aqueles que a rodeiam, mas
também seus próprios limites corporais. O que possibilita este processo é a
pressão maturacional, onde a pulsão para a individuação na criança normal é
segundo a autora algo inato, se manifestando durante a fase de separação e
individuação, valendo acrescentar, que esta fase está intimamente ligada ao
nascimento psicológico, já que para Mahler o nascimento biológico não surge ao
mesmo tempo em que o psicológico. —Mahler pensa que o nascimento psicológico
não coincide com o biológico. No momento em que o bebê sai do ventre materno
ele vive a si próprio e o mundo de formas indiferenciadas. Algo semelhante
ocorre na fase simbiótica que transcorre entre o primeiro e os quatro ou cinco
meses de idade“(Bleichmar, 1992, p.300).
A organização de Mahler sobre as fases do desenvolvimento
emocional do bebê e da criança passa por uma seqüência, estando uma interligada
à outra, ou seja, a passagem bem sucedida de uma vai dar origem à outra.
Margaret Mahler concebe o desenvolvimento psíquico em três fases:
O Autismo Normal
Esta etapa para a autora ocorre
entre o momento do nascimento e a quarta semana de vida. Os fenômenos
biológicos predominam, em grande parte, sobre os psicológicos. A
criança parece estar num estado de sonolência do qual só emerge para realizar
as atividades necessárias para a manutenção de seu equilíbrio fisiológico, onde
o investimento é basicamente semelhante
ao da vida intra-uterina, fazendo com que os estímulos do exterior,
através do tato, da audição ou do olfato, careçam de importância, em comparação
com as sensações vindas de seus órgãos
internos.
A Simbiose Normal
A criança ao entrar nesta fase
é aos poucos capaz de perceber os estímulos provenientes do mundo externo,
principalmente os produzidos pelos cuidados maternos. Assim, tanto sua
maturação neurofisiológica, como a dotação inata pode romper a barreira que
mantinha a onipotência dessa criança, visando protegê-la do mundo externo, onde
gradualmente o bebê começa a sentir-se parte de uma díade, também onipotente,
mas cujos integrantes são ele e sua mãe. Entre o primeiro e o quarto
mês de vida, o bebê vive uma fusão ilusória com a mãe, e os estímulos externos
ao serem percebidos pela criança começam a ser classificados em prazerosos e
desprazerosos, valendo ressaltar, que somente os estímulos prazerosos são
mantidos pela criança nessa fase, para que fique intacta a díade simbiótica. —Com o objetivo de manter intacta a díade
simbiótica, os estímulos que não são prazerosos devem ser projetados fora da unidade mãe-filho. Sua percepção e
classificação não se realizam inutilmente, pois deixam uma profunda marca na
criança, permitindo a maturação de um passo importante: a demarcação do ego
corporal“ ( Bleichmar, 1992, p.304).
Sendo Assim, o acontecimento
mais importante dessa fase é o investimento da mãe e para que a simbiose seja
bem sucedida, ambos os participantes
devem emitir sinais ao par simbiótico. Mahler acredita em um conceito cunhado
por Winnicott, o de sustentação, que deve ser exercido pela mãe a partir de
seus cuidados, visando possibilitar que se constitua uma unidade entre mãe e
filho suficientemente sólida para que a criança passe para a fase seguinte.
Separação e Individuação
A fase de separação e individuação tem início por volta
do quinto mês de vida, concluindo-se de maneira normal no terceiro ano de
idade. Essa fase divide-se em quatro subfases:
Subfase da Diferenciação
Começa em torno do quinto mês de vida, podendo
prolongar-se até o sétimo ou oitavo. Para que essa subfase se inicie é muito
importante que a criança esteja suficientemente familiarizada com sua mãe, onde
do ponto de vista comportamental o principal indicador de que esse fato está
ocorrendo é o sorriso específico do
bebê ante o rosto ou a voz da mãe. Esse sorriso específico indica que a criança reconhece sua mãe e,
portanto, que sua imagem foi investida. Valendo ressaltar, que também é
importante que nessa subfase a criança alcance habilidades para além do contato
simbiótico, fato que sugere um início de diferenciação, ou seja, começando a
distinguir sobre o que é ela e o que não é.
O bebê com as habilidades mencionadas acima, explora de
maneira tátil e visual sua mãe. Estendendo seu corpo para afastar-se da mãe ou
para vê-la melhor. Tal verificação permite que a criança, tanto identifique o
que é a mãe e o que não é, como também faz com que a criança faça distinções
entre si e sua parceira simbiótica. A
criança que reage com uma angústia intensa diante da presença de estranhos pode
não ter passado por essa subfase de maneira satisfatória, Já que não
aceita ficar distante da parceira simbiótica, não fazendo distinção sobre o que
é ela e o que não é. Sendo assim, o grau elevado de angústia diante da
separação materna sugere que a criança não passou pela etapa da simbiose normal
de maneira eficaz, já que o êxito da segunda fase indica a facilidade de
produção da diferenciação.
Muitas vezes, o desejo inconsciente da mãe sobre a
diferenciação de seu bebê desempenha um papel bastante importante. Tanto uma
mãe ansiosa demais para fazer com que o filho inicie sua independência, como
aquela que seja envolvente ao extremo por querer sua dependência a ela, pode
fazer com que a criança entre na subfase da diferenciação sem êxitos
satisfatórios ao seu desenvolvimento psíquico.
Subfase do Exercício Locomotor
Esta subfase ocorre entre os oito e os quinze meses de
vida, onde o exercício precoce é a
primeira etapa dessa subfase, época em que a criança começa a engatinhar,
adquirindo gradativamente as habilidades
necessárias para separar-se fisicamente da mãe. —A primeira
etapa, chamada de exercício precoce, é a que ocorre no início do
engatinhamento. A criança parece feliz e esquecida de sua mãe, apesar de
precisar voltar, a todo o momento, para seu lado. Para a equipe de
observadores, estes retornos pareciam constituir uma busca de recarregamento
emocional. Volta para ficar junto dela por alguns momentos, e depois volta a se
afastar“ ( Bleichmar, 1992, p.307).
Os dois elementos que levam ao
êxito desta etapa são, tanto à disponibilidade materna para aceitar a crescente
autonomia do filho, como à dotação inata da criança para realizar as atividades
motoras recém adquiridas. Quando esses dois elementos alcançam o
êxito a criança consegue passar para a segunda etapa do exercício locomotor, ou
seja, para o exercício propriamente dito. Assim, os investimentos voltados, em
um primeiro momento, para as habilidades motoras vão aos pouco se deslocando
para o ego autônomo que está em desenvolvimento.
Subfase da Aproximação
Ao chegar nesta etapa a criança
já pode ser vista como um ser humano separado, provido, tanto da capacidade
para a locomoção, como das habilidades
para o jogo simbólico e a linguagem. Sendo assim, essa subfase está intimamente
ligada ao nascimento psicológico, que na visão da autora não coincide com o
nascimento biológico.
A evolução das áreas cognitivas e perceptuais faz com que
a criança note a ilusão de onipotência que sentia na subfase do exercício
locomotor. Porém, em alguns momentos a criança sente a necessidade de se fundir
novamente à sua mãe, alternando, tanto atitudes de acompanhamento da mãe, como
atitudes voltadas para a fuga dela. —A luta que se trava em seu interior:
embora deseje se refundir com a mãe, teme ser absorvida por esta, a ponto de
perder a autonomia recém adquirida, e que tanto prazer lhe causa. Portanto, os
sentimentos que caracterizam esta subfase são essencialmente ambivalentes“ (
Mahler, 1993, p.90).
Mahler divide a subfase de aproximação em três etapas:
a) Começo da
aproximação: Onde a criança necessita compartilhar com a mãe suas descobertas
para que comece a alcançar sua autonomia. —... É típico desta etapa que
a criança traga os brinquedos com que está brincando, esperando da mãe uma
resposta concreta. Neste momento, a criança a percebe como objeto separado, o
que desperta angústia e temor, ao mesmo tempo em que estimula o sentimento de
autonomia, reforçando seu ego“ (Mahler, 1993, p.109).
b) Crise de
aproximação: Etapa ambivalente, em que criança parece estar em conflito entre a
sua autonomia e a necessidade de se fundir à mãe.
c) Modelagem da distância ótima: para
alcançar esta etapa a criança precisa já ter um começo: de internalização de
objetos bons e das regras (precursor do
superego); da linguagem e da expressão de desejos e fantasias, mediante
a algo simbólico.
Subfase da
Obtenção da Constância Objetal Emocional
Os elementos que visam a obtenção da constância objetal
emocional
são:
a) A dotação inata adequada.
Já que os defeitos inatos incluem: A incapacidade do ego
para neutralizar as pulsões agressivas, defeitos
perceptivos primários e dificuldades inatas no estabelecimento do vínculo com a
mãe, como é visto em crianças com o autismo primário.
b) A relação com uma mãe suficientemente boa
Pois os defeitos
da relação mãe-filho sejam por psicopatologia materna ou pela ausência
real do par simbiótico, podem dar origem à enfermidade mental.
c) As experiências vitais.
Já que os traumas, como: doenças, acidentes e
hospitalizações podem alterar a estabilidade da criança.
Sendo assim, a criança que chega
com êxito nessa última etapa pode se tornar um indivíduo independente, separado
e diferenciado da mãe e do meio. Valendo acrescentar, que a dotação inata
adequada, o suporte materno —suficientemente bom“ e as experiências vitais sem
traumas fisiológicos, são essenciais para que a criança alcance um
desenvolvimento psíquico saudável, fato que deixa bastante
claro o quanto o desempenho materno insuficiente pode prejudicar a passagem por
essas etapas, já que o bebê humano precisa do suporte materno suficientemente
bom no início de sua vida para alcançar sua sobrevivência física e psíquica.
Fontes:
O AUTISMO
INFANTIL
Denise dos Santos Pereira
Lim
Diponível em:
http://www.avezdomestre.com.br/monopdf/6/DENISE%20DOS%20SANTOS%20PEREIRA%20LIMA.pdf
http://www.scribd.com/doc/10881218/Margaret-Mahler
BLEICHMAR, N; BLEICHMAR, C. A psicanálise depois de
Freud: Teoria e clínica. Porto Alegre: Artmed, 1992.
MAHLER,
Margareth S. O Nascimento Psicológico da Criança. Simbiose e Individuação.
Artmed. Porto Alegre. 1993.
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