domingo, 6 de janeiro de 2013

MECANISMOS DE ADAPTAÇÃO FAMILIAR ÀS NECESSIDADES ESPECIAIS DA CRIANÇA



O impacto que a criança com necessidades especiais tem sobre a família vem sendo bastante pesquisado nas últimas décadas  A primeira geração de pesquisas sobre os efeitos da criança especial na família apresentava um panorama desanimador, em que o estresse, a sobrecarga, a depressão e o isolamento social eram as características predominantes. Contudo, com a ampliação do número de pesquisas nesta área, os modelos têm passado de interpretações deficitárias de ajustamento para o reconhecimento da possibilidade de uma adaptação mais positiva (SHAPIRO; BLACHER; LOPEZ, 1998).
O estresse é um dos fatores mais comumente investigado em mães de crianças com deficiências (BYRNE; CUNNINGHAM, 1985). A diferença no nível de estresse encontrado em famílias de crianças com e sem D pode ser decorrente do fato de que algumas mães de crianças D teriam mais dificuldades no ajustamento de aspectos pessoais relativos à maternidade (SHAPIRO et al., 1998) e, também, devido aos comportamentos agressivos e ao desempenho de suas crianças (SLOPER et al., 1991). Já as causas do estresse experienciado pelos pais são mais variadas, destacando o temperamento da criança, o isolamento e a retirada social (SHAPIRO et al., 1998), o status empregatício e a satisfação marital (HORNBY, 1995) e, também, a própria avaliação do genitor a respeito do funcionamento da família (DYSON, 1997).
Segundo MINNES (1998), os estudos sobre estresse na família podem ser agrupados segundo as características da criança deficiente, considerando a combinação de diferentes tipos de deficiências e o impacto da sobrecarga de cuidado com a criança. Estes aspectos são importantes, pois o grau de deficiência da criança tem emergido como um fator que contribui para o estresse parental, particularmente quando associado à dependência da criança, às necessidades de manejo, aos problemas de comportamento e à comunicação limitada. Os genitores têm uma sobrecarga adicional em vários aspectos de sua dinâmica individual e familiar, especialmente no que tange aos aspectos psicológicos, sociais, financeiros, e às atividades de cuidado da criança (ALI et al., 1994; SHAPIRO et al., 1998). Essa sobrecarga, por sua vez, pode estar relacionada aos sentimentos de ansiedade e incerteza quanto às questões de sobrevivência da criança, de seu desenvolvimento, de um compromisso de cuidado prolongado ou, mesmo, do próprio impacto desse cuidado sobre a vida pessoal da mãe, impondo-lhe um senso de limitação e restrição.
Com relação à depressão e ao ajustamento psicológico, alguns estudos mostram que as mães de crianças D apresentam taxas mais altas de depressão e enfrentam mais problemas com o ajustamento psicológico que os pais.
Outros sentimentos e estados emocionais podem ser observados nos genitores, tais como mágoa, sofrimento e um contínuo processo de luto (LEARY; VERTH, 1995), além de culpa (ALI et al., 1994).
Embora haja necessidade de se corrigir uma visão unicamente patológica a respeito das reações dos genitores à sua criança D, os resultados das pesquisas mostram diferenças significativas, pelo menos em algumas dessas dimensões, particularmente entre mães de crianças com e sem D e, também, entre mães e pais de crianças D. As evidências sugerem que as mães continuam sendo mais fortemente afetadas pelas obrigações de cuidados com a criança D. Por outro lado, não se tem clareza se os altos níveis de sintomatologia emocional e física estão relacionados à presença dessa criança ou à rede de variáveis mediadoras ou, ainda, às diferenças culturais entre homens e mulheres (SHAPIRO et al., 1998). Na verdade, todos esses fatores parecem influenciar a natureza e a intensidade das reações à criança D.
Além disso, segundo BYRNE e CUNNINGHAM (1985), os genitores utilizam as mais variadas estratégias para enfrentar os eventos estressantes. Tais estratégias dependem das variações existentes nos estilos cultural e ideológico das famílias e no contexto ecológico em que elas estão inseridas.
Sob o ponto de vista dos irmãos, os estudos indicam que não há dados significativos que apóiem a idéia de um relacionamento problemático entre os irmãos de crianças D ou que comprovem alguma desvantagem decorrente do fato de se ter um irmão D.
Por outro lado, os irmãos de crianças D relataram mais sentimentos de insatisfação, por não receberem atenção suficiente dos genitores, embora não tenham relatado problemas de solidão,omo os irmãos de crianças autistas.
Em síntese, ter uma criança D na família pode ser um evento estressante ou não, trazendo conseqüências para todos os membros em maior ou menor dimensão. Os dados sobre reações, sentimentos, estados emocionais e estresse experienciados por mães, pais e irmãos de crianças D não são, ainda, conclusivos, requerendo mais investigações para que se possa ter maior clareza sobre o que significa ter uma criança DM na família. Muitas são as variáveis que podem se associar para produzir ou intensificar os sentimentos e estados emocionais dentro da família. Estes sentimentos e emoções têm grande influência no tipo de relacionamento desenvolvido entre a criança e os membros familiares que, por sua vez, têm implicações diretas para o desenvolvimento da criança D.

Como é a dinâmica das relações em famílias de crianças deficientes?
Os relacionamentos familiares formam um sistema complexo de trocas interativas entre os subsistemas marital e parental que incluem díades, tríades, tétrades e outras constelações, organizadas em um todo integrado,  caracterizado por um processo de influências mútuas. Assim, as interações e relações ocorridas no subsistema marido-esposa influenciam aquelas ocorridas em outros subsistemas, especialmente no de genitores-criança.

O subsistema marido-esposa e as relações parentais
A qualidade da relação marital é um importante determinante das experiências
de maternidade/paternidade em todas as famílias, especialmente naquelas com crianças com deficiência . Nestas, os genitores têm demandas adicionais com a criação de sua criança D, geradas pela sobrecarga e estresse devido ao constante cuidado e atenção exigidos pela criança.No entanto, mães de crianças D não têm necessariamente mais disfunções em suas vidas que mães de crianças com desenvolvimento típico e, nem sempre, elas têm os piores casamentos ou sistemas sociais de apoio menos adequados (SHAPIRO et al., 1998). No estudo de FLOUD e ZMICH (1991), com 38 famílias de crianças D e 34 de crianças com desenvolvimento típico, compostas por mãe, pai e filhos em idade escolar, os resultados indicaram que a insatisfação marital estava mais associada aos problemas de comportamento da criança que à interação marital propriamente dita. As dificuldades de manejo da criança pelos genitores também foram atribuídas mais às limitações cognitivas e à pobre habilidade social da criança que à própria competência dos genitores como pais e mães. O estresse marital, por sua vez, foi associado às demandas de cuidado com as necessidades especiais da criança, às interações maritais negativas e à ocorrência de trocas aversivas com a criança. Um outro estudo com genitores de crianças com e sem DM, sobre o cuidado compartilhado e a satisfação marital, mostrou que a maior participação e envolvimento do pai no cuidado com a criança estavam associados a uma maior satisfação marital (WILOUGHBY; GLIDDEN, apud SHAPIRO et al., 1998). A literatura relativa aos efeitos da relação marital sobre as relações parentais precisa ser considerada com cautela, pois outros estudos mostram não haver uma diferença entre famílias de crianças com e sem D quanto ao seu funcionamento, adaptabilidade, coesão e satisfação marital (BRISTOL et al., 1988; SHAPIRO et al., 1998). Shapiro e seus colaboradores também encontraram estudos com um alto índice de divórcio e discórdia marital entre os genitores de crianças com síndrome de Down e outros que não mostraram diferenças entre esses índices quando famílias de crianças com e sem D foram comparadas. Entretanto, é preciso destacar que há uma variabilidade enorme de mecanismos de adaptação individual utilizados pelas famílias, baseados, em parte, nas características pessoais da criança, na gravidade da deficiência e na competência e recursos dos genitores como cuidadores. (BYRNE; CUNNINGHAM, 1985).

Fontes:

MUSTACCHI, Zan; PERES, Sergio. Genética baseada em evidências: síndromes e heranças. São Paulo. 2000.


Nenhum comentário:

Postar um comentário