Uma
noite, o professor P. estava sentado em sua escrivaninha, examinando um desenho dos nervos cranianos,
bastante parecido com o apresentado no Apêndice m deste livro. Enquanto
refletia sobre a localização e a função de cada nervo cra- niano, ficou impossível para de negar a
dolorosa verdade. A ironia da situação era que o professor P. era um neurocientista e conhecia
muito bem aquilo que estava experimentando. Seus sintomas começaram de forma
sutil, com pequenos déficits em equilíbrio. Ele provavelmente nem os teria
notado, mas a sua experiência como alpinista lhe havia ensinado a prestar
atenção
nessas coisas. O professor P. considerava que essas falhas ocasionais deviam-se
à idade - afinal, pensava, já havia passado da mocidade, e essas coisas
acontecem. De maneira semelhante, seu médico não parecia pensar que era um
problema que merecesse atenção, mas ainda assim monitorizava os seussintomas
cuidadosamente. Três anos depois, como os seus problemas de equilíbrio permaneciam,
o professor P. realmente começou a se preocupar. Ele estava tentando conversar
com um colega pelo telefone, mas não conseguia ouvir, devido ao que pensou ser
uma má conexão. Então, mudou o telefone para o outro ouvido e, de repente, a
voz tênue ficou mais alta. Ele experimentou essa troca várias vezes nos dias
seguintes, e a conclusão foi inevitável: o professor P. estava ficando surdo do
ouvido direito.
Ele
imediatamente marcou uma consulta com seu médico, que o indicou a um
especialista. Após um teste de audição superficial e pouco controlado, o
especialista lhe deu boas notícias: "Você está bem, professor P., muitas
pessoas experimentam perda de audição
quando chegam à meia-idade, e os seus problemas não são tão sérios assim para
se preocupar". Até hoje, o professor P. se arrepende de não ter insistido em buscar
uma segunda opinião, pois teria sido muito mais fácil lidar com o seu problema
naquele estágio. Foi por volta de um ano depois que o professor P. estava sentado
olhando a ilustração dos nervos cranianos. Nessa época, ele já havia começado a
experimentar falta de sensibilidade no lado direito da boca, estava tendo
problemas para engolir, e seus dutos lacrimais direitos não estavam
lacrimejando de modo suficiente. Lá estava ele, sentado, olhando o ponto em que
os nervos auditivos e vestibulares se unem para formar o nervo craniano VIII (o
nervo auditivo-vestibular). Ele sabia que estava lá e que já era
suficientemente grande para também afetar os nervos cranianos de V a X, mas não
sabia o que era: um tumor, um AVe, um angioma, uma infecção? Será que ele iria
morrer? Será que sua morte seria terrível e lenta, à medida que seu cérebro e
intelecto se deteriorassem gradativamente? Ele não marcou uma consulta com o
médico logo em seguida.
Um
amigo seu estava conduzindo estudo do cérebro com RM e ele se ofereceu como
voluntário para ser um sujeito-controle, sabendo que o seu problema apareceria
no exame. E foi o que aconteceu: um grande tumor, conforme previsto, no nervo craniano
VIII direito. Então com a RM em mãos, o professor P. voltou ao seu médico, que
o encaminhou a um neurologista, que, por sua vez, o encaminhou a um
neurocirurgião. Muitas semanas estressantes depois, ele se encontrava mantido
por aparelhos na unidade de terapia intensiva do hospital local, com as mãos
amarradas à cama e tubos aparentemente saindo de todas as partes de seu corpo. Veja
bem, o tumor era tão convoluto que levou seis horas para ser removido. Para
piorar, durante as seis horas em que o cérebro do professor P. esteve exposto,
entrou ar em seu sistema circulatório e ele desenvolveu pneumonia. À beira da
morte e com alucinações devido à morfina, o professor P. pensou ter ouvido a
sua esposa, Maggie, pedindo ajuda, e tentou ajudá-Ia: é por isso que ele estava
amarrado. Um tranqüilo professor alterado pela morfina não seria páreo para
cinco enfermeiros fortes que tentavam salvar a sua vida. O nervo
auditivo-vestibular do professor P. foi seccionado durante a cirurgia, o que o
deixou permanentemente surdo e sem função vestibular no lado direito. Ele
também ficou com paralisia hemifacial parcial, incluindo graves problemas
envolvendo a forma como piscava o olho e lacrimejava, mas esses sintomas faciais logo
passaram. O professor P. retomava agora para os seus alunos, sua pesquisa, seus
textos, esperando que o tumor tenha sido completamente removido e que não
precise passar por outra cirurgia. De fato, no exato momento em que escrevo
estas palavras, o professor P. está trabalhando na próxima edição do seu livro ...
Se ainda não lhe ocorreu, eu sou o professor P.
Um
tumor, ou neoplasma (literalmente "novo crescimento"), é uma massa de
células que cresce de forma independente do resto do corpo. Em outras palavras,
é um câncer. Cerca de 20% dos tumores encontrados no cérebro humano são
meningiomas - tumores que crescem entre
as meninges, as três membranas que cobrem o sistema nervoso central. Todos os
meningiomas são tumores encapsulados - crescem dentro de sua própria membrana.
Como resultado, eles são particularmente fáceis de identificar em um TC scan,
podem influenciar o funcionamento do cérebro apenas pela pressão que exercem
sobre o tecido adjacente e são quase sempre tumores benignos - removíveis por
cirurgia com pouco risco de maior crescimento no corpo.
Infelizmente, a encapsulação é a exceção em
vez da regra, quando se trata de tumores cerebrais. Com exceção dos
meningiomas, a maioria dos tumores cerebrais é infiltrante. Os tumores infiltrantes
crescem de forma difusa através do tecido adjacente. Como resultado, eles
normalmente são tumores malignos. É difícil removê-los ou destruí-los
completamente. Assim, qualquer tecido canceroso que permanecer após a cirurgia continua
a crescer.
Fonte:
Biopsicologia
– John P. J. Pinel
Para saber mais acesse:
Causa de Lesões Cerebrais
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