domingo, 30 de dezembro de 2012

A PSICOLOGIA INDIVIDUAL DE ADLER


A psicologia individual de Adler

Adler chamou sua teoria de psicologia individual porque ele acreditava piamente nas motivações exclusivas dos indivíduos, e na importância da posição percebida por cada pessoa na sociedade. Como Jung,  ele proclamou com segurança a importância dos aspectos teleológicos,  ou a  orientação para metas, da natureza humana. Outra principal diferença entre suas filosofias, relacionada com a anterior, é que Adler,  mais preocupado do que Freud com as condições sociais, via a necessidade de tomar medidas preventivas para evitar distúrbios na personalidade.

Luta pela superioridade

Para Adler (1930), a principal essência da personalidade é a luta pela superioridade. Quando as pessoas têm um irresistível sentimento de desamparo ou vivenciam alguns acontecimentos que fazem com que se sintam impotentes, elas em geral se sentem inferiores. Se esses   sentimentos tornarem-se difusos, a pessoa pode desenvolver complexo de inferioridade. No complexo de inferioridade, sentimentos normais de incompetência assumem proporções bem maiores, fazendo com que o indivíduo sinta que parece impossível alcançar metas e, portanto, que não vale a pena tentar. Veja o caso de João. que nunca foi muito bem na escola. Ele não é um péssimo aluno, mas comparado às distinções e conquistas acadêmicas de seus irmãos, seu histórico escolar parece insignificante. Com o tempo, ele desenvolveu um complexo de inferioridade - sentimento desconfortável de ser estúpido, até mesmo inferior a seu irmão e sua irmã.
A luta individual para superar esse complexo pode criar o complexo de superioridade como forma de manter um sentimento de auto-estima. Na verdade, foi isso que João fez. Se você fosse apresentado a ele, jamais suporia que ele tem uma questão de "inferioridade" a ser resolvida. Ele parece ter ótima opinião sobre si mesmo - está sempre se jactando e pronto para defender que sua solução para um problema é a mais correta. Entretanto, se você observá-Ia mais de perto, verá que sua arrogância exagerada, na realidade, é uma supercompensação do que ele acredita faltar nele; ele desenvolveu complexo de superioridade como forma de neutralizar a inferioridade que sente. Está tentando convencer as outras pessoas e a si mesmo de que afinal de contas ele tem valor. Infelizmente para João, os complexos de superioridade em geral são considerados detestáveis por outras pessoas, e ele, portanto, está propenso a ser tratado com reserva ou mesmo aversão quando a atitude arrogante sobressair-se. Essa rejeição, por sua vez, pode aumentar seus sentimentos mais íntimos de falta de valor, desencadeando uma compensação ainda mais agressiva, e a espiral enlouquecida então começa.

A EVOLUÇÃO DA TEORIA DE ADLER

A teoria de Adler  passou por uma série de mudanças à medida que suas opiniões sobre as motivações humanas evoluíam. O primeiro conceito que ele descreveu foi o de inferiodade orgânica - a idéia de que todo mundo nasce com alguma fragilidade física. É nesse “elo  frágil", diz Adler, que a incapacidade ou doença tende a se enraizar e, portanto tenta compensar a eficiência em outra área. (Observe que essa idéia é um tanto semelhante à teoria sobre homeostasia)  Adler sustentou que as enfermmidades (e talvez, mais importante do que isso,)as reações individuais a essas enfermidades, eram motivadores que influenciavam nas opções de vida das pessoas.
Pouco tempo depois, Adler adicionou a seu modelo o conceito de impulso para agressão. Ele acreditava que os impulsos poderiam ser imediatamente efetivos ou revertidos  em impulso oposto (isso se assemelha ao mecanismo de defesa proposto por Freud). A agressão  era particularmente importante para Adler, porque ele acreditava que esta era  reação à percepção de impotência ou inferioridade - ataque violento contra a incapacidade de alcançar ou de dominar alguma coisa.
O passo seguinte de Adler foi por ele chamado de protesto masculino. Contudo, ele  queria dizer que somente os garotos vivenciam esse fenômeno. Durante esse período  da hístória,  era apropriado cultural e socialmente usar as palavras feminilidade e masculinidade  e  feminiidade  como metáforas de inferioridade e superioridade. Adler acreditava que todas as crianças virtude de sua relativa dependência e falta de autoridade na ordem social, eram marcadamente femininas, e que tanto os garotos quanto as garotas vivenciam esse protesto masculino a fim de tornarem-se independentes e, conseqüentemente, iguais aos adultos e às pessoas de poder no seu pequeno mundo. O protesto masculino é a tentativa individual de ser competente e independente - autônomo - em vez de meramente um rebento dos pais. Às vezes, a luta pela superioridade pode ser saudável quando envolve uma assertividade positiva.
A busca de autonomia e de percepção de controle e eficácia foi posteriormente incorporada nas teorias de inúmeros outros psicólogos da personalidade. Por exemplo, Robert White (1959) foi responsável pela introdução dos conceitos de motivação para a eficácia e competência na corrente do pensamento psicanalítico em voga. Ele achava que isso tinha origem em suas próprias experiências e desejos de competência e afirmação dignificada como uma pessoa mais jovem - motivações que, segundo White, a filosofia freudiana negligenciou.
Um aspecto ou conceito relacionado, importante para Adler, foi chamado de luta pela perfeição. Adler acreditava que as pessoas não ligadas neuroticamente a um complexo de inferioridade passam a vida tentando alcançar suas metas ficcionais. (Isso às vezes é chamado de "finalismo ficcional".) Essas metas, que variam de pessoa para pessoa, refletem o que cada uma considera perfeição e exigem que sejam eliminadas as imperfeições identificadas. A crença na realidade dessas metas ficcionais é, algumas vezes, chamada de filosofia "como se". Todos nós temos metas ficcionais. Por exemplo, uma das metas ficcionais de “Cleo” é a de ter uma" carreira perfeita". Ela imagina que pode levar a escola com "um pé nas costas" e tirar boas notas, concluir seu estágio de interna em um prestigiado hospital e ser convidada para trabalhar em uma multinacional que ofereça ambiente de trabalho agradável, salário invejável e oportunidades de viagem. Claro, ela também seria muito bem-sucedida e eficiente em seu cargo, agradaria todos os seus superiores e os surpreenderia com seu grande talento. Na realidade, Cleo não está tirando a escola de letra; ela está dando duro para manter a média. Ainda não dá para saber se ela vai conseguir residência em um prestigiado hospital ou simplesmente um trabalho comum; se vai galgar o plano de carreira da muItinacional ou ficar no banco de reservas. Porém, ter essas metas ficcionais a motiva e faz com que se concentre mais; visualizar um futuro reluzente é sua pequena recompensa. Se ela sonhasse com menos, talvez nunca conseguiria alcançar nenhum desses sonhos. Em vez disso, ela sonha alto e, embora sem dúvida possa ter algumas decepções, provavelmente tornará muitos dos seus desejos realidade. 
Adler tinha muito interesse em saber como os indivíduos percebem a responsabilidade social e como a entendem. Aproveitando-se da análise de Freud sobre o amor e o trabalho, Adler identificou três questões sociais fundamentais que ele acreditava todos nós deveríamos observar:

(1)                      atividades ocupacionais - escolher e perseguir uma carreira que nos faça sentir dignos; (2) atividades sociais - fazer amigos e criar redes sociais; e (3) atividades amorosas - encontrar um parceiro de vida adequado.
Além disso, ele acreditava que todas as três estavam entrelaçadas, ou seja, as experiências em qualquer dessas áreas influenciariam as outras duas.

o papel da ordem de nascimento

Concentrando-se na estrutura social e fazendo observações significativas (tanto sobre outras pessoas quanto sobre sua infância), Adler passou a acreditar na importância da ordem de nascimento na determinação das características da personalidade. As crianças primogênitas vivem por um tempo como o filho favorito porque são "filhos únicos". Mais tarde elas devem lidar com a constatação de que não são as únicas a precisar de atenção e que os pais,  portanto, precisam dividir essa atenção com os outros filhos. Esse despertar um  tanto inclemente pode criar uma tendência à independência e à luta por reaver o status ou,  outra forma, o primogênito pode tornar-se um falso pai preocupado com o social, ajudando a educar os próprios irmãos e as outras pessoas. As crianças do meio nascem em uma circunstância de disputa e competição. O próprio Adler enfrentou intensa sensação de estar disputando com seu irmão mais velho; sua incapacidade de competir em termos físicos, em decorrência dos problemas de saúde, foi responsável por sentimentos subsequentes de inferioridade. Conquanto isso possa ser útil no sentido de estimular o filho do meio a realizar feitos mais notáveis, erros recorrentes podem ser muito prejudiciais à auto-estima. Os caçulas normalmente são mais mimados do que todos os outros. Eles serão a vida toda o "bebê da  família". Adler acreditava que o excesso de modelos do papel de irmão poderia levar essa criança a sentir-se sobremodo pressionada a ser bem-sucedida em todas as áreas, e a possível incapacidade de atingir isso poderia gerar atitude indolente e derrotista.
Os conceitos sobre ordem de nascimento e personalidade (que na verdade originam-se  em  parte do trabalho anterior de Francis Galton) produziram quantidade imensa de pesquisas; dentre as várias descobertas, identificou-se que os primogênitos são de fato mais propensos a ir para a faculdade e a ser bem-sucedidos como cientistas (Símonton, 1994). Porém, quanto aos caçulas, é mais provável que sejam criativos, rebeldes, revolucionários ou vanguardístas. O livro Born to Rebel (Sulloway, 1996) propõe que as revoluções na ciência,religião, política e movimentos sociais são desproporcionalmente conduzidos pelos caçulas.
Com base em ampla revisão crítica da biografia de 6.000 pessoas proeminentes na história Ocidental, Sulloway concluiu que, embora os primogênitos mostrem disposição a alto nível d'e realização, eles são esmagadoramente menos propensos que os caçulas a propor ou apoiar pontos de vista revolucionários. Sulloway ressalta a dinâmica da família - em que os primogênitos parecem adotar diferentes estratégias de sobrevivência que os caçulas - para explicar o efeito da ordem de nascimento sobre a propensão que fomenta discórdia e aceita idéias radicais. O próprio CharIes Darwin é exemplo clássico de caçula revolucionário: os dados nos quais Darwin fundamentou sua teoria da evolução, em 1837, eram amplamente acessíveis aos cientistas de sua época, mas foi necessária a rebeldia de um caçula para reconhecer que esses dados exigiam a reconsideração herética da doutrina do plano divino, então aceita. Observe que, para a abordagem de Sulloway, tanto quanto para a de Adler, não é a posição na ordem de nascimento per se que é importante, mas as motivações que ela cria. Adler, portanto, preparou o caminho para muitos psicólogos motivacionais do futuro.
Os estudos sobre a ordem de nascimento normalmente não separam os efeitos da ordem biológica de nascimento dos efeitos da ordem de criação. Por exemplo, se o primogênito morrer ao nascer, então o segundo filho será o irmão mais velho. Ou, se o primogênito de uma família for adotado por outra família que já tem filhos, esse novo filho será primogênito do ponto de vista biológico, mas será criado como caçula. Há diferenças biológicas já sabidas entre uma gravidez e outra (por exemplo, o útero é menor na primeira gravidez, as condições hormonais são diferentes, os seios na amamentação podem estar diferentes, e assim por diante). Entretanto, pesquisas futuras deveriam prestar mais atenção à elucidação sobre o que ocorre quando o nascimento biológico é diferente da ordem de criação (Beer & Horn. 2000). Contudo, há uma evidência genuína de que primogênitos tendem a realizações e a ser mais conscienciosos do que os caçulas (Paulhus, Trapnell & Chen, 1999).

A tipologia da personalidade proposta por Adler

Adler tentou unir suas idéias com o clássico conceito grego de humores subjacente à personalidade. De acordo com essas idéias antigas, a predominância da bílis amarela era indicativa de um temperamento irritável (colérico); do sangue acreditava-se que resultava um temperamento sangüíneo (otimista); da bílis negra resultava um temperamento sorumbático (melancólico) e da fleuma, um temperamento letárgico (fleumático). A esse modelo básico Adler acrescentou suas idéias sobre níveis variados de interesse social, bem como a avaliação sobre nível de atividade.
 Adler renomeou os quatro componentes de sua tipologia:
(1) dominante (agressivo e dominador). (2) obtentor (tira dos outros; um tanto quanto passivo), (3) evitante (vence os problemas fugindo) e (4) socialmente útil (enfrenta os problemas realisticamente; é cooperativo e cuidadoso). Presume-se que essa tendência desenvolve-se de experiências antigas. Adler escreveu que um corpo incompatível com seu ambiente será sentido pela mente como um fardo. As crianças que sofreram de "imperfeição física" são desafiadas a tentar superar seus limites, tanto de maneira ativa, que não é social (tornando-se dominadoras), como de modo ativo, que é social (cooperação); de maneira passiva, não social (pegando o que as outras pessoas dispensam), ou de maneira passiva, deprimida (fugindo dos problemas). Em grande parte das crianças que são desafiadas, a mente torna-se sobrecarregada e elas passam a ser autocentradas (egoístas). O caminho para a saúde física e mental requer a superação desse egocentrismo. Da mesma maneira que nas grandes teorias, foi muito difícil estabelecer a validação simples e empírica para essa tipologia.
Alguns dos conceitos de Adler sobre a grande importância das situações sociais foram desenvolvidos posteriormente por Harry Stack Sullivan, examinados no Capítulo 10 (sobre as abordagens interacionistas da personalidade). Adler também preparou o caminho para pensadores como Erich Fromm, que, além de ter reconhecido tanto o lado básico e biologicamente impulsionado da personalidade quanto as severas restrições sociais da personalidade, também tentou reconciliar essas forças com as idéias de criatividade. amor e liberdade. Erich Fromm e essas idéias são analisados mais adiante, no Capítulo 9 (sobre os pontos de vista h umanísticos e existenciais da personalidade) . Talvez a maior contribuição de Adler para a psicologia da personalidade tenha sido sua insistência na natureza positiva e orientada para metas da humanidade. Ele nos deixou uma imagem de pessoas que lutam para superar suas fraquezas e ter um desempenho produtivo - em outras palavras, pessoas que contribuem para a sociedade.


COMPARAÇÃO ENTRE A TIPOLOGIA DE ADLER
E A TIPOLOGIA CLÁSSICA GREGA



Humores
Gregos
Tipos
Gregos
Nível de Interesse Social
Nível de Atividade
Tipos de Adler
Bílis amarela
Colérico
Baixo
Alto
Dominante
Fleuma
Fleumático
Baixo
Baixo
Obtentor
Bílis negra
Melancólico
Muito baixo
Baixo
Evitante
Sangue
Sanguineo (Otimista)
Alto
Alto
Socialmente útil


Fonte:
 Teorias da Personalidade – da teoria Clássica à Pesquisa Moderna
( Friedman&Schustack)

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