domingo, 30 de dezembro de 2012

TEORIA DE BION



Teoria de Bion 



Wilfred Bion passou a infância na Índia. Aos oito anos passou a viver em um pensionato na Inglaterra e nunca mais retornou a Índia, que amava. Seus anos na escola da preparação foram os mais infelizes. A uma criança de 8 anos deve ter parecido como se alguma volta incompreensível e desastrosa do destino o tinha privado dos pais, do repouso e da luz do sol, e tinha-o despejado em uma terra estrangeira habitada por meninos pequenos, repugnantes e malditos com o mesmo maldito clima. Foi somente mais de três anos depois que viu sua mãe outra vez - e então, momentaneamente, não a reconheceu. No tempo que entrou na escola sênior já se tinha adaptado bem, "juntou-se ao inimigo" e apreciou os cinco anos seguintes. Disse sempre que o que o conservou foram seu tamanho grande, sua força física e habilidade atlética.
Saiu da escola em 1915, imediatamente antes do seu 18º aniversário, e juntou-se ao Regimento Real de Tanques em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial. Serviu na França e esteve no serviço ativo até o fim da guerra. Recebeu o DSO (Distinguished Service Order), e a Legião de Honra. Subseqüentemente, estudou história no Queen's College da Universidade de Oxford e medicina na University College London. Bion dedicou-se muito a natação e o rugby, e tornou-se excelente desportista.
Formado em medicina, seu interesse na psicanálise aumentou. Submeteu-se então, a um treinamento em análise supervisionado pela psicanalista Melanie Klein - pioneira no estudo da relação mãe e filho, na idade de latente - que influenciou o pensamento de Bion.
Bion foi psiquiatra no exército britânico durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhando em maneiras de melhorar a seleção dos oficiais e tratando vítimas. É conhecido particularmente pelo seu trabalho no Tavistock Institute, em Londres. De seu trabalho com o exército, reteve um foco em indivíduos e em grupos.
Melanie Klein não era simpática ao seu trabalho com grupos: em sua opinião estava em contradição com o trabalho analítico. Ela suspeitava de algumas de suas teorias psicanalíticas, embora reconhecesse finalmente sua validez. Bion, por seu lado, não considerava o trabalho com grupos como divorciado totalmente daquele da análise.
Durante a guerra, casou-se uma atriz bem conhecida, Betty Jardine, que morreu tragicamente quando sua filha nasceu em 1945. Assim no fim da guerra estava aflito, com um bebê para cuidar, muito pouco dinheiro e nenhuma renda regular. Foi liberado do serviço para cuidar da criança. Sua educação era difícil. Tornou-se estranha a ele e foi-se para a Itália com 17 anos. Reconciliaram-se mais tarde e ela transformou-se em uma psicanalista considerada, mas morreu prematuramente em um choque de carro em 1998.
Bion apaixonou-se por Francesca, que se transformou em sua segunda esposa. Existe um volume de suas cartas ardentes que foram publicadas em um segundo volume de sua autobiografia: Todos os meus Pecados de Amor Recordados (1985).
Durante os anos 40, produziu seu trabalho abrindo caminho na dinâmica de grupo, sendo Experiências com Grupos o ápice desse trabalho. Abandonando seu trabalho neste campo no favor da prática psicanalítica, elevou-se subseqüentemente à posição do diretor da Clínica de Psicanálise de Londres (1956-1962).
Mais tarde tentou compreender os pensamentos e o pensar a partir de um método matemático e científico, acreditando existir preconceitos no vocabulário existente. Mais tarde ele abandonou a aproximação matemática e científica para uma compreensão mais estética e intuitiva, acreditando que a experiência da verdade entre o psicanalista e o paciente era algo quase místico.
De 1962 até 1965, Bion foi presidente da Sociedade Psicanalítica Britânica.
Passou seus últimos anos em Los Angeles, Califórnia. Realizou diversos seminários no Brasil a partir da década de 1970, influenciando profundamente diversos profissionais da área.


TEORIA DO PENSAMENTO DE BION

  
Em “Formulações sobre os dois princípios do funcionamento mental” (1911) Freud afirma: “a decepção ante a ausência da satisfação esperada motivou o abandono de sua tentativa de satisfação por meio de alucinações e para substituí-lo, o aparelho psíquico teve que se decidir a representar intrapsiquicamente as circunstâncias reais do mundo exterior, e tender à sua modificação real”.

O pensamento, as emoções e o conhecimento são indissociados entre si, sendo que o pensamento precede o conhecimento, porquanto o indivíduo necessita pensar e criar o que não existe, ou  o que ele não conhece.

Bion, nos trabalhos: “Uma Teoria do Pensamento” (1962) e “Elementos em Psicanálise” (1963), introduziu as seguintes concepções:

Da mesma forma como para Freud, também a teoria do pensamento de Bion tem como ponto de partida a frustração das necessidades básicas que são impostas ao lactante.

Para Bion o essencial é a maior ou menor capacidade do ego do lactante poder tolerar o ódio resultante dessas frustrações. Ele considera fundamental se vai haver uma fuga em relação à frustração ou uma modificação desta.

Bion introduz a noção de que é necessária uma distinção entre elementos do pensamento e os pensamentos propriamente ditos. Para Bion, “o pensar é um desenvolvimento forçado sobre o psiquismo, pela pressão dos elementos dos pensamentos, e não o contrário”.

Na realização positiva há uma confirmação de que o objeto necessitado está realmente presente e atende às suas necessidades.

Na realização negativa, o lactante não encontra um seio disponível para a satisfação e essa ausência é vivenciada como a presença de um seio ausente e mau dentro dele.

Para Bion todo objeto necessitado, em princípio, é sentido como sendo mau porque se ele o necessita é porque não tem posse dele; logo, esses objetos são maus porque a sua privação provoca muito sofrimento.

Se a capacidade inata do ego para tolerar as frustrações for suficiente, a experiência do “não seio” torna-se um elemento do pensamento (protopensamento) e se desenvolve um aparelho psíquico para “pensá-lo”. 
  
Se a capacidade inata para tolerar as frustrações for insuficiente, o “não seio” – mau -, deve ser evadido e expulso pelo emprego de maciças identificações projetivas.

As experiências de realização negativa são inerentes e indispensáveis à vida humana, e elas podem seguir dois modelos de desenvolvimento:

Se o ódio resultante da frustração não for excessivo à capacidade do ego do lactante em suportá-lo, o resultado será uma sadia formação do pensamento, através da “função α”, a qual integra as sensações e as emoções.

A função α é a primeira que existe no aparelho psíquico e é ela quem vai transformar as sensações e as primeiras experiências emocionais em elementos α.

Os elementos α são processados pela função α, são  utilizados pela mente para a formação de sonhos, recordações e para as funções de simbolizar. 

Os elementos α formam um conjunto denominado de “barreira de contato” que resulta do conjunto formado pelos elementos α, demarca a fronteira de contato e de separação entre  o consciente e o inconsciente.

Se o ódio resultante da frustração for excessivo, os elementos do pensamento que se formam, denominados “elementos β”, não se prestam para a função de serem pensados e precisam ser imediatamente aliviados, portanto, descarregados pela criança.

Os elementos β são protopensamentos, ou seja, experiências emocionais e sensoriais primitivas e que, portanto, não puderam ser pensadas até um nível de conceituação ou de abstração, elas devem ser  expulsas e evacuadas para fora.

Os elementos β formam um conjunto denominado de “pantalha ou tela β” a qual não possibilita uma diferença entre o inconsciente e o consciente, entre a fantasia e a realidade e nem a elaboração de sonhos. 

A essência da formação dos pensamentos úteis depende não só da capacidade de tolerância às frustrações, como também da capacidade em suportar as depressões, ou seja, vai depender basicamente do modo da passagem da posição esquizo-paranóide para a posição depressiva.

A relação entre o pensador e o pensamento, sob o modelo continente-conteúdo, foi estudada por Bion e, segundo ele, adquire três formas:

A primeira é a forma parasitária, na qual o pensador e o pensamento novo se desvitalizam, se destroem entre si e se nutrem de mentiras que funcionam como uma barreira contra a verdade.

A segunda é a forma comensal, em que o pensador convive com o seu pensamento sem grandes atritos e, se não impede a evolução, também não possibilita grandes mudanças.

A terceira é a forma simbiótica, pela qual o pensador e o pensamento se harmonizam e se beneficiam mutuamente entre si.
  

TEORIA DO CONHECIMENTO DE BION

  
O eixo central da formação do Conhecimento e do Pensamento é a maior ou menor capacidade do ego da criança em tolerar as frustrações decorrentes das privações. A criança tanto pode fugir dessas frustrações, criando mecanismos que evitem conhecê-las (ela evita o problema, mas não evita a angústia), como pode aprender a modificar a realidade, através da atividade do pensar e do conhecer.

O desenvolvimento cognitivo da criança será mais ou menos exitoso dependendo de três fatores: 
de como a mãe real utiliza o seu próprio pensar e conhecer e de como contêm as angústias do seu filho;

da capacidade da criança quanto à formação de símbolos;

do desejo de conhecer a respeito dos conteúdos mentais como estando intimamente relacionado com as emoções de amor e ódio.

O termo vínculo designa uma experiência emocional pela qual duas ou mais pessoas, ou duas partes de uma mesma pessoa estão relacionadas entre si.

VÍNCULO DO AMOR (L)

Até 1920 o trabalho psicanalítico estava praticamente reduzido a um enfoque centralizado quase que exclusivamente nas pulsões libidinais.

À medida que os conhecimentos da teoria e prática da psicanálise foram evoluindo, tornou mais claro que:
as demandas por amor não são unicamente de natureza libidinal e sexual (conforme formulação original de Freud);
as manifestações de amor provenientes do Instinto de Vida são inseparáveis do Instinto de Morte;
as demandas por amor procedem de uma fonte original muito anterior: na relação diádica com a mãe, e elas estão representando uma necessidade de preenchimento de vazios afetivos, para garantir a sobrevivência psíquica.

 
VÍNCULOS L, H, K 


VÍNCULO DO ÓDIO (H)

Principalmente a partir das concepções da escola kleiniana, os psicanalistas passaram a valorizar o vínculo do ódio como sendo um integrante fundamental de toda e qualquer relação objetal, intra ou interpessoal.

VÍNCULO DO CONHECIMENTO (K)

O vínculo K foi conceituado por Bion como sendo aquele que existe entre um sujeito que busca conhecer um objeto e um objeto que se presta a ser conhecido. Representa também um indivíduo que busca conhecer a verdade acerca de si mesmo. 

Bion aprofundou-se nas particularidades do vínculo do Conhecimento, correlacionando-o com: 
outras funções do ego, como a do pensamento, linguagem, juízo crítico etc.;
com os problemas relativos à Verdade, Falsidade e Mentira;
com Ataque aos Vínculos, os quais permitiriam a percepção das intoleráveis verdades, tanto as externas como as internas;
a substituição do Conhecimento pela tríade: Arrogância, Estupidificação e Curiosidade Maligna.

Em síntese, podemos afirmar que esses três tipos de vínculos são indissociados entre si e dependem, diretamente, tanto da disposição hereditária da criança como, e, principalmente, da capacidade de reverie da mãe. 

   
Se a capacidade de reverie da mãe for suficiente a criança terá condições de fazer uma aprendizagem com as experiências das realizações positivas e negativas impostas pelas privações e frustrações e, neste caso, ela desenvolve uma função K.
  
Se a capacidade de reverie da mãe for insuficiente a criança desenvolve um vínculo –K (a mãe é introjetada pela criança como uma pessoa que a destitui de seus objetos bons e a obriga a ficar com os objetos maus), ou pode resultar num vínculo “não K”. 


Fonte: 

Os Quatro Vínculos: Amor, Ódio, Conhecimento e Reconhecimento na Psicanálise e em Nossas Vidas - David Zimerman.




2 comentários:

  1. Muito bom e bem escrito, queria ler mais.

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  2. Texto muito bom; conciso e objetivo. Facilitou-me melhor compreensão sobre a Teoria do Pensar de Bion

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