ADOÇÃO
PROCESSOS PSICODINÂMICOS, PSICOSSOCIAIS E JURÍDICOS
A adoção é definida como um
processo pelo qual uma criança é levada para dentro de uma família por um ou
mais adultos que não são seus pais biológicos, mas são reconhecidos pela lei
como seus pais (Kaplan, 2003).
No Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA (1990), a adoção está disposta nos artigos 39 a 52, sendo esta uma forma de colocação em família substituta que confere a condição de filho a criança ou o adolescente.
Do ponto de vista de Ribeiro
(2002), o processo de adoção pode envolver situações muito dolorosas, tanto
para as crianças, quanto para os pais. Este processo pode ser traumático, mas
uma boa relação dos filhos com seus pais adotivos, onde a criança se sinta
amada e compreendida pode minimizar este sofrimento.
Percebe-se que existem
concepções distorcidas em relação à adoção, comumente considerada um
acontecimento que envolve segredos, omissões e mentiras. Frente a tal realidade, o autor assinala que no
Brasil, o principal desafio consiste em apoiar todas as iniciativas que
permitam compreender que a adoção deva ser vivida fundamentalmente para a
criança, cabendo aos adotantes o gesto maduro do amor incondicional, apoiados
por movimentos sociais competentes em todas as fases da integração familiar
adotiva (Freire, 1991).
Steinhauer (1992) acrescenta
existir uma concordância geral que o sucesso ou fracasso na adoção depende das
características dos pais adotivos, daquelas da criança e da capacidade de cada
um satisfazer as necessidades do outro, aceitando as limitações.
Conforme Papalia e Olds
(2000), não apenas as pessoas casadas, mas também pessoas solteiras, idosas ou
casais de homossexuais têm se tornado pais adotivos. Mas ainda existem
preconceitos e idéias errôneas sobre a adoção. Uma crença seriamente errônea é
a de que as crianças adotadas são destinadas a ter problemas porque foram
privadas de seus pais biológicos. Um estudo com 715 famílias com adolescentes
que tinham sido adotados quando bebês constataram que quase três a cada quatro
delas achava que a adoção desempenha um papel pouco importante na sua
identidade.
A adoção no nosso país é
ainda usualmente vista como um recurso para a infertilidade, constituindo uma
das causas para a procura maciça de bebês. Somente crianças de até três anos de
idade conseguem ser adotadas em famílias brasileiras.
Adotar uma criança realmente envolve riscos e desafios. Além das questões usuais de paternidade e maternidade, os pais adotivos precisam lidar com a aceitação de sua esterilidade (caso sejam por isso que tenham adotado), a necessidade de explicar a adoção para a criança, e o possível desconforto em torno do interesse da criança pelos pais biológicos.
Aspectos Jurídico-Legais
A Lei Federal n° 8.069 de 13
de julho de 1990 que compõe o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
estabelece o conceito de adoção apenas em caráter pleno, incontrastável e
imutável para menores de 18 anos ou maiores, caso ocorra convivência iniciada
antes do adotando chegar à maioridade (Campos, 2004; Costa, 1992).
Os mesmos autores explicitam
que, de acordo com o ECA (1990), o(s) adotante(s) devem ter mais de 21 anos e
serem pelo menos 16 anos mais velhos do que o(s) adotando(s), independentemente
do seu estado civil. Porém, com a promulgação do Novo Código Civil, Lei n°
10406, sancionada em 2002 e vigente a partir de janeiro de 2003, a menoridade
cessa aos 18 anos, reduzindo a idade mínima para os adotantes, uma vez que essa
idade habilita a pessoa a todos os atos da vida civil, mantendo-se a diferença
mínima entre adotante e adotando de 16 anos. Esta nova lei estabelece ainda que
ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se estes forem casados, ou
estiverem mantendo uma relação estável. Pelo menos uma dessas duas pessoas
(adotantes) deve ser maior de 18 anos desde que comprove estabilidade da
família. A adoção é irrevogável e dá ao adotado os mesmos direitos sucessórios
de um filho natural.
A adoção cria um laço de parentesco civil entre as partes, mas esse laço não é extensivo às respectivas famílias – o adotado não se torna parente dos parentes do adotante, e vice-versa. Os vínculos jurídicos entre o adotado e seus pais de sangue não se extinguem, exceção feita ao poder pátrio – direito de educar o filho, representá-lo até os dezesseis anos nos atos civil, etc. – que passa para o adotante.
O adotado só será herdeiro
do adotante se este não tiver filhos por ocasião da adoção. Se o adotante tiver
filhos depois da adoção, o adotado herdará a metade do legado dos filhos de
sangue (Weber, 2005).
Inevitavelmente, neste
processo, não são apenas as crianças que tem sentimentos de ansiedade e temor
despertados. Em uma pesquisa realizada em uma Vara da Infância e da Juventude
da cidade de Porto Alegre – RS, evidenciou-se a gama de pessoas que estão
envolvidas e são acometidas por estes sentimentos, como psicólogos, assistentes
sociais, profissionais da área jurídica, entre outros (Campos & Costa,
2004).
Nesta mesma pesquisa, as
autoras apontam para a importância dos fatores psicossociais que podem
influenciar nos trâmites e nas avaliações do processo adotivo, como história
pessoal do profissional supervisor, da criança e do adotante.
Aspectos Psicológicos
A idade mais conveniente
para adoção, apontada pela maioria dos autores, é a mais precoce possível, até
os 2 meses de vida, de acordo com o que postula Bowlby (2002) de preferência
antes da fase em que o objeto materno começa a ser reconhecido na sua
individualidade e como diferente das outras pessoas que se aproximam do bebê.
Esta indicação deve-se ao fato das crianças serem especialmente sensíveis a
rupturas precoces nas relações já estabelecidas.
Reduzindo o período de tempo anterior à adoção diminuem-se, em princípio, as possibilidades da existência de traumatismos que possam repercutir na sua evolução. E sabe-se como serão importantes para o futuro os primeiros anos de vida. Da parte dos pais, adotar uma criança em seus primeiros dias ou meses, facilita o desenvolvimento do sentimento de verem como sua esta criança (Diniz, 1989).
A paternidade adotiva é distinta da paternidade biológica e requer compreensão e aceitação das diferenças. Os pais adotivos, por suas necessidades, ao oferecerem solução a um difícil problema dos pais biológicos, dando uma família real à criança, estão se envolvendo em uma série de questões específicas. Os vários autores apontam a busca de sua verdadeira identidade pelo adotado, o segredo e a revelação da adoção, a presença de dois pares de pais, entre outros, como fatores universalmente presentes no funcionamento da família adotante (Diniz, 1989).
Vários estudos demonstram que, de maneira geral, a visão de família apresentada por crianças institucionalizadas, através da brincadeira de faz-de-conta, segue o modelo de família conhecido pelas crianças no decorrer de suas vidas. Elas iniciam a brincadeira construindo a família de uma forma muito semelhante à que todos têm, ou seja, a concepção nuclear.
Tipos de adoção
Existem vários tipos de
adoções: uma criança pode ser abandonada pelos pais biológicos no nascimento ou
poucas semanas após este, ser adotada; a criança pode passar meses anos em
instituições, antes da adoção;
um padrasto ou madrasta podem adotar a criança, após a morte de um dos
genitores; em algumas adoções, os pais biológicos eram casados, mas em outras
não; existem adoções étnicas mistas, nas quais um genitor de determinado grupo
étnico adota uma criança de outro grupo; em circunstâncias fora do comum um
adulto pode ser adotado; recentemente solteiros de ambos os sexos tem adotado
crianças (Glenn, 1996).
Casais Adotantes
A necessidade de ser pai ou
ser mãe encontra-se além da capacidade física de um homem e de uma mulher
gerarem uma criança, pois esta necessidade não é apenas biológica, mas também
psicológica. Os desejos de gerar um filho tem suas raízes na biologia, num
processo de identificação com os pais e a transitoriedade de vida. Os casais
que não têm filhos podem apresentar limitadas expectativas em relação ao
futuro. Os filhos ajudam a elaboração do luto relativo à própria morte. A falta de um filho faz com que vivam a solidão e
pode ser vislumbrado um ponto final em suas vidas. Esta situação pode
determinar um quadro típico de depressão, no qual procuram atenuar através da
adoção de um filho que será uma forma de resgatar a fantasia e o sentimento de
continuar vivendo (Costa, 1992).
Decisões e motivações para adoção
A decisão de adotar um filho
constitui-se numa defesa contra a ferida narcísica de não poder gerar um filho.
O indivíduo sente-se criticado com a impossibilidade de gerar um filho e
rejeitado pelo ideal de ego (pais internalizados) e procura resgatar a
perfeição ferida sob forma de um novo ideal do ego que vai ser o filho adotado (Costa, 1992).
As histórias de adoções
estão repletas de ingredientes comuns e via de regra referem-se a abandonos,
rejeições, expectativas e idealizações, esterilidades, rompimentos, uniões,
negações e salvamentos de vidas ou casamentos (Souza, 1994).
O cônjuge estéril, na
maioria das vezes, é que propõe a adoção. Momento, no qual, o cônjuge fértil
exterioriza proteção e amor em relação ao cônjuge estéril. A motivação
inconsciente de uma adoção pode ser uma situação de luto não elaborada, então o
papel reservado à criança adotada será o de substituir alguém que foi perdido,
às vezes um dos pais do casal, um filho, ou um aborto (Costa, 1992).
A necessidade de adotar, às vezes pode estar associada à auto-imagem de fracasso pessoal. A idéia de ser um fracasso como pai ou mãe, simboliza ter filhos com problemas, podem achar enxertados com sua auto-imagem de ser um fracasso biologicamente também (Glenn, 1996).
No que se refere às motivações dos pais adotivos, constatou-se numa pesquisa que a maioria tinha um interesse pessoal e primordial: satisfazer o desejo de ser pai/mãe. Outras motivações evidenciaram a necessidade de preencher a solidão, proporcionar companhia a um filho único; escolher o sexo do seu próximo filho; substituir um filho natural falecido, entre outros. No entanto, é importante ressaltar que, apesar dessas motivações "menos nobres" do que visar o interesse do adotado, não houve prejuízos evidentes no que se refere ao relacionamento de pais e filhos adotivos. Este dado traz uma nova luz sobre as chamadas "motivações inadequadas" e suas conseqüências para a futura relação. Levanta-se a hipótese de que, após a adoção, o vínculo afetivo, que é construído entre pais-filhos adotivos, poderá ser tão forte a ponto de neutralizar o suposto efeito dessas motivações, tidas como "inadequadas". Parece que o amor que permeia as relações pode explicar essas aparentes contradições, como sabiamente já disse Pascal, em sua mais famosa premissa: "O coração tem razões que a própria razão desconhece". Fica muito claro, portanto, que não existe uma determinação absoluta entre uma motivação "imprópria" para a adoção e o fracasso do relacionamento. Este dado mostra claramente a viabilidade de trabalhar tais adoções mesmo a posteriori, e garantir pleno desenvolvimento afetivo entre as pessoas envolvidas (Weber, 2005).
Medos na Adoção
Existe um sentimento de
inveja relacionadas com as capacidades procriativas dos pais que se torna uma
fonte de conflito nos casais estéreis. Para lidar com esse sentimento é bom
diminuir a importância da maternidade e adotar um filho, que neste caso tem o
significado de “roubar um filho dos pais”. O temor é que a mãe verdadeira da criança
é efetuar uma substituição completa da família natural pela adotiva queira
tomá-la de volta (Costa, 1992).
Ambos os pais não gostam de
ser lembrados de sua história procriativa, por causa do afeto de vergonha que
lhe é associado. Um medo dominante nos pais adotivos é perderem o amor da
criança ou até mesmo o próprio relacionamento. A preocupação básica da criança
adotada é perder a sua mãe adotiva (Glenn, 1996).
Segundo este mesmo autor, quando estão tendo problemas com a criança, os pais adotivos não mencionam o fato da adoção em consultas a respeito desses problemas. Quando o fato é revelado, com freqüência se faz acompanhar pelas palavras “mas isto não tem influência sobre o problema”. Eles precisam negar a adoção a todas as circunstâncias que a rodeiam, muitas vezes por medo, mas criança adotada ou não poderá ter problemas, sim. E naturalmente, muitos pais adotivos estão cientes disso e não as escondem do consultor.
Revelação da adoção
A difícil opção de
silenciar, guardando para si segredos que acabam sendo camuflados por piedosas
inverdades, pode estar calcada em conflitos não resolvidos do casal.
Constrói-se, por vezes, um constante clima de sobressalto ligado ao temor de
que alguma pessoa revele a verdade, porém, se eventualmente a criança captar,
pela intuição, o não dito, ficará confusa se os pais quiserem convencê-la do
contrário.
Não existe um momento
definido para este esclarecimento, assim como inexiste um momento para informar
um filho de sua legitimidade, porque ele poderá ter dúvidas a este respeito. A
indecisão desaparece se os pais adotivos aceitam a verdade de que não são os
pais biológicos, o problema crucial a ser enfrentado não é a época da
revelação, mas a injúria narcísica que ela representa àqueles indivíduos que
sentem dificuldades em aceitar sua infertilidade ou a do cônjuge.
A verdade só existe
verdadeiramente quando a atualizamos, a incorporamos ao acervo das nossas
convicções e de nossas vivências. É a partir dessa maneira de aceitar e de
viver a verdade que se estabelece à conduta dos pais adotivos de reconhecê-la
não só como um direito do filho, como também uma necessidade para se conquistar
a saúde mental e psicológica (Filho, 1994).
Relacionamento dos pais adotivos
É comum do cônjuge deprimido
decidir-se pela adoção e o outro pela culpa por concordar e, por algum tempo o
casal poderá passar a viver uma situação de conflito devido a mudanças
estruturais pelo ingresso do adotado no relacionamento conjugal. Pode ocorrer
um risco de que um dos cônjuges para se defender da depressão se vincular ao
adotado, de maneira que o outro sinta-se desprezado, arrependa-se da adoção e
passe a rechaçar a criança, criando um círculo vicioso, difícil de ser
quebrado, resultando, não raro em separação do casal (Costa, 1992).
Para pensar em adotar um
filho, é preciso que se tenha instalado entre os membros que formam o casal uma
relação de afeto que possibilite vivenciar em conjunto a experiência da adoção
como um sólido projeto de vida. É preciso que estejam se amando, para que
possam amar junto o filho esperado (Filho, 1998).
Expectativas
Geralmente, os pais adotivos
investem no bebê que irá chegar uma fantasia grandiosa de ser gênio para
recuperar o amor supostamente perdido por algo (Costa, 1992).
Muitas vezes, os adultos
fazem das crianças o repositório de sua imaginação e expectativas, não se dando
conta das conseqüências futuras de suas fantasias. Os filhos carregam sobre si
o peso das esperanças dos pais para depois, muitas vezes, arrastarem, também, o
fardo das suas frustrações (Filho, 1998b).
A Criança Adotada
Todos os filhos são
biológicos e todos os filhos são adotivos. Biológicos, porque essa é a única
maneira de existirmos concreta e objetivamente; adotivos, porque é a única
forma de sermos verdadeiramente filhos (Filho, 1998).
As crianças adotadas sofrem
dos mesmos conflitos, crises e distúrbios que afetam as crianças consangüíneas.
A experiência de ser uma criança adotada faz vir à tona reações defensivas
adaptativas. Todas as
tensões e conflitos dos pais adotantes – suas personalidades, razões especiais
à esterilidade, motivos para a adoção e expectativas quanto a esta, a
expressarem-se de modo verbal ou não-verbal, influenciam a criança (Glenn,
1996).
Os filhos adotivos, também
pela pressão social preconceituosa e aderindo ao modelo transmitido por seus
pais, relatam que não têm curiosidade nem interesse em saber sua própria
história, ou de seus pais biológicos. Na verdade, existe um acordo tácito e
velado de não se falar a respeito da adoção: os pais procuram encobrir sua esterilidade,
o medo fantasioso de que o filho volte para sua família de origem e a
impossibilidade de ter um filho do "seu próprio sangue"; os filhos
não falam a respeito para não magoar seus pais e para encobrir sua própria
mágoa de ter sido rejeitado por sua família de origem e assim perdem um pedaço
de sua identidade. Um outro ilustre personagem das histórias infantis,
Super-homem, tornou-se "super" exatamente quando soube com detalhes a
sua origem; uma interpretação livre sobre o fato é que o abandono das dúvidas e
fantasias sobre sua família biológica criou condições para o fortalecimento e
construção de sua personalidade e identidade (Weber, 2005).
Para amar o filho, não é
preciso conhecê-lo, no sentido de esquadrinhar sua personalidade ou mapear seu caráter.
Amamos, porque estabeleceu-se desde o início o desejo e a disponibilidade de
tê-lo (não importa a forma) e querê-lo incondicionalmente (Filho, 1998).
O assunto da adoção
despertam emoções poderosas e defesas inconscientes associadas à fantasia de
abandono. Os terapeutas não são imunes a esta reação e podem insistir em que as
reações desenvolvimentais da criança adotadas são ocasionadas por outros
traumas que não o conhecimento de que são adotadas. As crianças adotadas
possuem outros problemas e, atitude a respeito de seu status adotivo podem
mesmo representar uma defesa, outra uma ansiedade provida de outras fontes
(Glenn, 1996).
Muitas vezes, os adultos
fazem das crianças o repositório de sua imaginação e expectativas, não se dando
conta das conseqüências futuras de suas fantasias. Os filhos carregam sobre si
o peso das esperanças dos pais para depois, muitas vezes, arrastarem, também, o
fardo das suas frustrações (Filho, 1998).
Foi feita uma pesquisa que revelou sobre as relações entre filhos e pais adotivos são plenamente satisfatórias, pois a maioria deles não teve dificuldades na educação e no relacionamento afetivo com a criança, diz ser estar em relação a seu filho e à adoção realizada e aconselha outras pessoas a adotar. As dificuldades encontradas por alguns pais adotivos no relacionamento com seu filho foram, geralmente, provenientes de revelações tardias de sua condição de adotivo ou feitas de maneira não adequada por terceiros e não pelos próprios pais. Alguns comportamentos apresentados como negativos nos relacionamentos de pais e filhos adotivos estão presentes, da mesma forma, nos relacionamentos de pais e filhos biológicos, tais como desobediência, rebeldia, maus hábitos... Existe alguma relação perfeita? E o que seria uma relação perfeita? Na verdade, todos têm seus problemas, e o mais importante não é não ter problemas, mas saber como lidar com eles, pois como disse Guimarães Rosa, "viver é muito perigoso" (Weber, 2005).
As maiores possibilidades de sucesso na adoção encontram-se em casais em que a adoção resulta da plena aceitação da realidade, tanto sua quanto da criança. A adoção que com freqüência é melhor sucedida na prática, é aquela que embora o casal tendo filhos, resolvem adotar uma criança, geralmente movidos pelo desejo de proporcionar a um pequeno desamparo pela sorte a felicidade que já desfrutam. Se torna melhor sucedida pelo fato de a realidade não dar margens a falsificações (Costa, 1992).
O amor é a parte fundamental do ato, sem dúvida. Chamando atenção, que mais fundamental ainda que o amor e as boas intenções é a negação dos processos inconscientes adotantes. Podendo ter a esperança de transformar amor e boa intenção em um ato saudável, protetor e genuinamente amoroso (Costa, 1994).
Adotar uma criança é um ato
de amor e uma forma de filiação. É um processo que vai além das questões
biológicas em busca da realização do sonho de ser mãe e pai. A chegada de um
novo indivíduo numa família implica num amadurecimento por parte dos pais, os
quais deverão dar atenção, carinho e muito amor para auxiliar na identidade e
crescimento da criança. Desta forma, os pais passam a rever diversas questões a
respeito de suas experiências passadas, presentes e das que possivelmente
virão.
É preciso, simultaneamente a um trabalho de conscientização sobre a importância da adoção, um esforço para desmistificar a associação genérica e errônea entre adoção e fracasso. As dificuldades que ocorrem são muito semelhantes com aquelas que aparecem em famílias biológicas. E de qualquer forma, mesmo a vivência de tais dificuldades e preconceitos é muito menos dolorosa do que a solidão, o vazio, a falta de identidade, a ausência de vínculos e o desamparo de uma criança abandonada.
O processo de adoção é permeado por muitas emoções, tais como, medo, ansiedade constrangimento, dúvidas e incertezas, sendo que estes sentimentos podem ser conscientes ou não por todos os participantes deste processo.
KAPLAN & SADOCK.
Compêndio de Psiquiatria. 9ª edição. Artmed. Porto Alegre. 2007.
PAPALIA, Diane E. Desenvolvimento
Humano. 8ª edição. Artmed. Porto Alegre 2006.
JAIME, I. M.,
JAIME, S. Â. Adoção.
<Disponível em:> http://salini.ourinhos.com.br/giaaro/
26/ 05/ 2000.
http://www.redepsi.com.br/portal/modules/smartsection/item.php?itemid=293A FAMÍLIA NA PÓS-MODERNIDADE
O conceito de família pode ser considerado até certo
ponto subjetivo, pois depende de quem a define, do contexto social, político e familial
em que está inserido. A Constituição Federal de 1988 representou um marco na
evolução do conceito de família, ao corporificar o conceito de Lévy-Brul, de
que o traço dominante da evolução da família é sua tendência a se tornar um grupo
cada vez menos organizado e hierarquizado e que cada vez mais se funda na
afeição mútua (GENOFRE, 1997).
A família é um sistema no qual se conjugam valores,
crenças, conhecimentos e práticas, formando um modelo explicativo de saúde doença,
através do qual a família desenvolve sua dinâmica de funcionamento, promovendo
a saúde, prevenindo e tratando a doença de seus membros (ELSEN, 2002).
Família também pode ser conceituada como uma unidade de
pessoas em interação, um sistema semi-aberto, com uma história natural composta
por vários estágios, sendo que a cada um deles correspondem tarefas específicas
por parte da família (BURGENS; ROGERS apud ELSEN, 2002).
A partir das diversas concepções de família e de nossa
própria vivência familiar, entendemos família como um sistema inserido numa diversidade
de contextos e constituído por pessoas que compartilham sentimentos e valores
formando laços de interesse, solidariedade e reciprocidade, com especificidade
e funcionamento próprios. Os conceitos podem ser diversos, mas um ponto comum é
que a união dos membros de uma família, com ou sem laços consangüíneos, se dá a
partir da intimidade, do respeito mútuo, da amizade, da troca e do
enriquecimento conjunto.
Através dessa relação é que se desenvolve a cultura
familiar, definida por Elsen (2002) como um conjunto próprio de símbolos,
significados, saberes e práticas que se define a partir das relações internas e
externas à família, e que determina seu modo de funcionamento interno e a
maneira como a família desenvolve suas experiências e interações com o mundo
externo. Essas experiências caracterizam-se pelas ações e
interações presentes no núcleo familiar e direcionado a cada um de seus membros
com o intuito de alimentar e fortalecer seu crescimento, desenvolvimento, saúde
e bem-estar.
No contexto dinâmico, complexo e singular que é o da
família, o diálogo é destacado por Andrade (2001) como essencial no
compartilhar de experiências, conhecimentos, sentimentos e necessidades, tanto
da família em seu conjunto e de seus membros em particular, quanto da relação
destes com aquele que se dedica a estudar a família mais de perto. Althoff
(2002) salienta que as conversas familiares representam a oportunidade que as
pessoas têm de expressar sua individualidade, trocar experiências e fixar
valores e crenças comuns. Assim, a despeito das definições ou classificações
que as famílias recebem, um ponto importante a se considerar é que esta é uma
realidade, que está viva, e que como todo ser vivo necessita ter saúde para
assim permanecer. Mais do que uma idéia ou conceito, a família tem
materialidade na convivência entre seus membros. Como processo contínuo de
abstração e concretude, ela é a unidade essencial do viver humano, através da
qual, ora como pano de fundo, ora como determinante explícito, vão sendotecidas
as especificidades de seus membros.
Algumas
Transformações
Significativas
mudanças ocorreram na sociedade brasileira. Sua transformação de sociedade
rural, na qual predominava a família patriarcal e fechada em si mesma, para uma
sociedade de bases industriais com as suas implicações de mobilidade social,
geográfica e cultural acarretou transformações igualmente marcantes na
estrutura do modelo tradicional de família.
O século XX foi cenário de grandes transformações na
estrutura da família. Ainda hoje, porém, observamos algumas marcas deixadas
pela suas origens. Da família romana, por exemplo, temos a autoridade do chefe
da família, onde a submissão da esposa e dos filhos ao pai confere ao homem o
papel de chefe. Da família medieval perpetua-se o caráter sacramental do
casamento originado no século XVI. Da cultura portuguesa, temos a
solidariedade, o sentimento de sensível ligação afetiva, abnegação e
desprendimento (RIGONATTI, 2003).
Em todo o mundo, o conceito de família nuclear e a
instituição casamento intimamente ligada à família, passaram por
transformações. A expressão mais marcante dessas transformações ocorreu no
final da década de 60: cresceu o número de separações e divórcios, a religião
foi perdendo sua força, não mais conseguindo segurar casamentos com relações
insatisfatórias. A igualdade passou a ser um pressuposto em
muitas relações matrimoniais. A partir daí, surgem inúmeras organizações
familiares alternativas: casamentos sucessivos com parceiros distintos e filhos
de diferentes uniões; casais homossexuais adotando filhos legalmente; casais
com filhos ou parceiros isolados ou mesmo cada um vivendo com uma das famílias
de origem; as chamadas “produções independentes” tornam-se mais freqüentes; e
mais ultimamente, duplas de mães solteiras ou já separadas compartilham a
criação de seus filhos. Chegamos ao século XXI com a família pós-moderna ou
pluralista, como tem sido chamada, pelos tipos alternativos de convivência que
apresenta. Peixoto e Cicchelli (2000) assinalam que nas últimas décadas
falou-se muito a respeito da crise da família, numa alusão à baixa taxa de
fecundidade, ao aumento da expectativa de vida e, conseqüentemente, à crescente
proporção da população com mais de 60 anos. Além disso, os autores também
aludem ao declínio do casamento e da banalização das separações como fatores
constituintes da tal “crise”. Os autores afirmam que o que caracteriza esse
processo a que se chama de crise, não é propriamente o enfraquecimento da
instituição família, mas o surgimento de novos modelos familiares, de novas
relações entre os sexos, numa perspectiva igualitária, mediante maior controle
da natalidade, e a inserção massiva da mulher no mercado de trabalho, entre
outros aspectos. Senna e Antunes (2003) apontam que a composição das famílias
brasileiras, especialmente nas últimas três décadas, vem passando por várias
alterações, do ponto de vista demográfico, e embora tais alterações ocorram de
forma diferenciada nas diversas regiões do país, algumas ocorrem de forma mais
ou menos similar, como a redução da natalidade e o aumento da longevidade das
pessoas. As autoras assinalam que as famílias vêm se tornando menores, e com
um número maior de idosos em sua composição, com prevalência de doenças
crônicas e de problemas decorrentes do processo de envelhecimento. Nas famílias
das camadas mais empobrecidas da população a realidade de composição familiar é
bem diferente do modelo tradicional de família nuclear, onde o pai é o
provedor, a mãe cuida da casa e os filhos estudam. De acordo com as autoras,
elevou-se o número de núcleos familiares compostos apenas por mulheres e seus
filhos menores, e também o número de indivíduos e mesmo de famílias moradores
de rua (SENNA; ANTUNES, 2003). Muitas famílias têm vivido situações
especiais de risco, com doenças, desemprego, conflitos conjugais intensos,
envolvimento em atividades ilícitas e problemas com a polícia, dependência de
drogas, distúrbios mentais, etc, que as tornam incapazes de articular
minimamente os cuidados de seus membros, e por isso necessitando atenção
diferenciada do Estado para garantir os direitos de cidadania das crianças,
idosos e deficientes físicos ali presentes (VASCONCELOS, 1999). Nas regiões
urbanas brasileiras, tem se observado que o núcleo familiar tende a ser um
tanto diferente daquele descrito por estudos clássicos sobre o ciclo de vida
familiar, tal como em Ceverny e Berthoud (1997). Em tais regiões, o núcleo
familiar é predominantemente composto por várias gerações, como uma forma de
melhor enfrentar as dificuldades financeiras. Os filhos adultos, mesmo
quando constituem suas próprias famílias, continuam compartilhando o habitat
original, somando rendimentos com o objetivo de baratear os custos com a
habitação e garantir melhores cuidados às crianças e a outros dependentes que não
participam ativamente no mercado de trabalho, como os adolescentes, os idosos,
os desempregados e os deficientes.
Suas Funções
Atualmente, porém, a família parece ser mais
influenciável do que influente. Foi com o movimento
higienista do século XIX, que ela começou a perder a sua capacidade de cuidar
da saúde e educação de seus membros, tornando-se bastante dependente dos
profissionais da saúde e da educação. Costa (1983) aponta que as famílias
vêm, há tempos, vivendo conflitos internos e dificuldades
sócio-econômicas que conferem pouca credibilidade em seu poder de ação. Acabam
ficando a mercê dos doutores do conhecimento, não porque lhes falte potencial
ou boa vontade, mas porque são subestimadas. Na tradicional divisão de
tarefas dentro do lar ocorrem modificações importantes: com o trabalho fora de
casa, decorrente da inserção feminina no mercado de trabalho, o tempo da mulher
para o cuidado dos filhos foi diminuindo e o homem foi mudando seu espaço no
interior da família, assumindo inclusive tarefas antes tipicamente femininas. A
mulher torna-se mais competente no trabalho, autônoma e competitiva, ao mesmo
tempo em que o homem aprende a ser mais cuidadoso e cuidador nas relações.
Essas alterações nos papéis sociais levaram a adaptações dos homens e das
mulheres, não sem relutância de ambas as partes, pois da mesma forma que foi
difícil para o homem abandonar o papel de senhor absoluto do modelo tradicional
de família, para a mulher foi penoso abrir mão do papel de rainha do lar,
frágil e submissa, ao qual estava secularmente acostumada, e do qual comumente
angariava algumas vantagens secundárias, numa espécie de poder paralelo no
mundo privado. Neste panorama, as mulheres desempenham papel importante na manutenção
da vida cotidiana do grupo familiar exercendo, além do trabalho doméstico, o
preparo e manutenção dos alimentos, confecção do vestuário, a procura por
preços mais baixos para as compras, na tentativa de contribuir na diminuição
dos gastos. Somado a tudo isto, a mulher participa no orçamento familiar com
trabalho remunerado realizado dentro ou fora do lar, o que potencializa a
sobrecarga física e psíquica e os conseqüentes agravos à saúde da mulher.
O conceito de gênero se faz importante quando se estuda a
família, pois, torna possível uma compreensão renovada e transformadora das
diferenças e desigualdades entre mulheres e homens; na medida em que pode
ampliar o conhecimento para além das diferenças individuais, salientando as
interações sociais que influem nos resultados educativos e ocupacionais, entre
tantos outros. A visão de gênero como construção cultural e histórica
implica em que se considere o sistema social de gênero, ou seja, o conjunto
de categorias e arranjos simbólicos através dos quais a sociedade transforma um
macho em homem e uma fêmea em mulher, em como transforma a biologia sexual em
produto da atividade humana (STREY, 2001). Na estrutura familiar, as
crianças são os membros mais vulneráveis às situações de conflitos no grupo e,
neste sentido, estão mais expostas que os demais, justamente por não ter
autonomia e capacidade plena de defesa e resolução. Com relação aos
adolescentes, a situação é praticamente a mesma, com o agravante de que, muitas
vezes, eles são depositários de expectativas e esperanças de ascensão do grupo
familiar, sofrem com a frustração destas expectativas, tanto pelo contexto
familiar de sobrevivência, como pelo contexto de possibilidades de inserção
social. A família se apresenta como mescla de conformismo às exigências sociais
e como forma fundamental de resistência contra essa mesma sociedade. Mantém a
subordinação feminina e dos filhos, mas protege mulheres, crianças e velhos
contra a violência urbana; cria condições para a dominação masculina, mas
garante aos homens um espaço de liberdade contra sua subordinação no trabalho;
conserva tradições, mas é o espaço de elaboração de projetos para o futuro, é
não só núcleo de tensões e de conflitos, mas também o lugar onde se obtém
prazer (CHAUÍ, 1986).
Diante da sociedade tão desigual em que vivemos, é
possível encontrarmos famílias com laços afetivos e estabilidade econômica
definidos, famílias sem recursos assistenciais ou direitos sociais, famílias
nucleares por conveniência ou sobrevivência, características estas que, segundo
Santana e Carmangnani (2001), devem ser entendidas e analisadas de forma a
compreender as transformações e significados das relações familiares.
Importantes modificações têm ocorrido na estrutura da
família, conforme se transforma a sociedade nas diferentes maneiras de produzir
materialmente a vida dos homens. Com a discussão panorâmica que ora
apresentamos em torno da temática, quisemos enfatizar as diferentes concepções
sobre família que circulam na sociedade, face a multiplicidade de estudos e
áreas do conhecimento que se debruçam sobre a instituição familiar.
A concepção que temos de família, enquanto sistema
relacional inserido numa diversidade de contextos e constituído por pessoas que
compartilham sentimentos e valores, formando laços de interesse, solidariedade
e reciprocidade, com especificidade e funcionamento próprios. Um
sistema articulado de valores, crenças, conhecimentos e práticas, como espaço
físico e psicológico relevante ao processo de socialização e humanização de
seus membros.
A família desempenha papel fundamental não só na relação
com seus membros enquanto “lócus” de afiliação e/ou de reafiliação social dos
mesmos, mas também na relação com o Estado, na perspectiva de instituição
social decisiva ao desenvolvimento do processo de integração/inclusão social de
seus membros.
Através do incentivo à construção da autonomia e
independência de seus membros, a família estará, de acordo com Cicchelli
(2000), favorecendo a formação de um indivíduo capaz de organizar sua própria vida
e responsabilizar-se por suas relações sociais, e fortalecendo a manutenção de
laços afetivos já existentes, bem como a formação de novos laços.
CHAUI, Marilena de Souza. Conformismo e resistência:
aspectos da cultura popular no Brasil. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1989.
CERVENY, Ceneide Maria de Oliveira; BERTHOUD, Cristiana
Mercadante Esper. Visitando a família ao longo do ciclo vital. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.
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