Desenvolvimento psíquico
Winnicott propõe que a maturação emocional se dê em três etapas
sucessivas: a da integração e personalização, a da adaptação à realidade e a de
pré-inquietude ou crueldade primitiva.
Integração e personalização
Para Winnicott as experiências iniciais ou diádicas são estruturantes do
psiquismo, participam da organização da personalidade e dos sintomas. O bebê
nasce em um estado de não integração. Onde os
núcleos do ego estão dispersos e, para o bebê, estes núcleos estão incluídos em
uma unidade que ele forma com o meio ambiente. A meta desta etapa é a
integração dos núcleos do ego e a personalização – adquirir a sensação de que o
corpo aloja o verdadeiro self. O objeto unificador do ego inicial não integrado
da criança é a mãe e sua atenção (holding).
Na etapa
inicial de desenvolvimento a questão primordial é a presença de uma
mãe-ambiente confiável que se adapte às suas necessidades de maneira
virtualmente perfeita. Gurfinkel (1999) lembra que Winnicott inclui entre as
“necessidades do ego” tanto os cuidados físicos quanto os psíquicos. Nem a realização
mecânica das tarefas físicas ligadas ao lidar com o bebê, e nem a resposta
imediata às suas demandas pulsionais implicam a satisfação das necessidades do
ego.
A integração é obtida a partir de duas séries de experiências: por um lado
tem especial importância a sustentação exercida pela mãe, que “recolhe os
pedacinhos do ego”, permitindo a criança que se sinta integrada dentro dela;
por outro lado há um tipo de experiência que tende a reunir a personalidade em
um todo, a partir de dentro (a atividade mental do bebê). Chega um período em
que a criança, graças às experiências citadas, consegue reunir os núcleos do
seu ego, adquirindo a noção de que ela é diferente do mundo que a rodeia. Esse
momento de diferenciação entre “eu” e “não-eu” pode ser perigoso para o bebê,
pois o exterior pode ser sentido como perseguidor e ameaçador. Essas ameaças
são neutralizadas, dentro do desenvolvimento sadio, pela existência do cuidado
amoroso por parte da mãe.
A personalização – definida por
Winnicott como “o sentimento de que a de que a pessoa de alguém encontra-se no
próprio corpo”. O autor propõe que o desenvolvimento normal levaria a alcançar
um esquema corporal, chamando-o de unidade psique-soma. Gurfinkel (1999)
diz que a psique e o soma – que formam o esquema corporal de todo indivíduo –
interpenetram-se e desenvolvem-se em uma relação dialética, e apresentam o
paradoxo da diversidade na unidade.
Para
Winnicott mente e psique são conceitos diferentes; trata-se de registros
relacionados, mas heterogêneos. A psique
é a elaboração imaginativa das partes, sentimentos e funções somáticas e não se
separa, nem se divide do soma. A mente, no desenvolvimento saudável, não
é nada mais do que um caso particular do funcionamento do psicossoma, surgindo
como uma especialidade a partir da
parte psíquica do psicossoma.
Adaptação à realidade
A medida
que o desenvolvimento progride, a criança tem um ego relativamente integrado, e
com a sensação de que o núcleo do si-próprio habita o seu corpo. Ela e o mundo
são duas coisas separadas. A etapa
seguinte é conseguir alcançar uma adaptação à realidade.
Nessa etapa a mãe tem o papel de prover a criança com os elementos da
realidade com que irá construir a imagem psíquica do mundo externo. A adaptação absoluta do meio ao bebê se torna adaptação
relativa, através de um delicado processo
gradual de falhas em pequenas doses.
Bleichmar e
Bleichmar (1992) dizem que para Winnicott a fantasia precede a objetividade, e
o seu enriquecimento com aspectos da realidade depende da ilusão criada pela
mãe; tudo repousa no vínculo precoce da criança com sua mãe. Mas o acoplamento
entre alucinação infantil e os elementos da realidade fornecidos pela mãe nunca
poderá ser perfeito. No entanto, o lactante pode vivê-lo como quase ótimo,
graças a uma parte de sua personalidade, que procura preencher o vazio entre
alucinação e realidade – a mente.
Winnicott
considera que a atividade mental da criança faz com que um meio ambiente
suficiente se transforme em um perfeito, converte o relativo fracasso da
adaptação em um sucesso adaptativo. O
autor fala que o que libera a mãe de ser quase perfeita é a compreensão da
criança.
A mente se desenvolve através da capacidade de compreender e compensar as
falhas; é uma função do ambiente à medida que ele começa a falhar, Gurfinkel
(1999) diz que é apenas à medida que o ambiente falha que ele começa a existir
para o bebê enquanto realidade. Portanto, se no
início, a tarefa da mãe é adaptar-se de maneira absoluta às necessidades do
bebê, em seguida, será de fundamental importância que ela possa fornecer um fracasso gradual da adaptação para que a
função mental do bebê se desenvolva satisfatoriamente. O resultado disto
será a emergência da capacidade do próprio sujeito de cuidar de seu self,
atingindo um estágio de dependência madura.
Quando o
ambiente não proporciona os cuidados que o psicossoma considera como
elementares, a mente se vê obrigada a uma hiperatividade, o pensamento do
indivíduo começa a assumir o controle e a organizar o cuidado ao psique-soma,
podendo ocasionar uma oposição entre mente e psicossoma, ocasionado um
distanciamento do verdadeiro self. Em estado de saúde, a mente não usurpa as
funções do meio, mas possibilita uma compreensão e eventual aproveitamento de
sua falha relativa.
Crueldade primitiva (fase de pré-inquietude)
Depois de a
criança ter alcançado a diferenciação entre ela e o meio circundante e se
adaptar em certa medida à realidade, pela absorção de pautas objetivas dela,
que modificam suas fantasia, o último passo que deve dar é integrar em um todo
as diferentes imagens que tem de sua mãe e do mundo.
Winnicott
pensa que a criança pequena tem uma cota inata de agressividade, pode exprimir determinadas condutas auto-destrutivas.
O bebê volta seu ódio sobre si mesmo
para proteger o objeto externo; mas esta manobra não é suficiente e em sua
fantasia a mãe pode ficar intensamente danificada. (Bleichmar e
Bleichmar, 1992).
Fase depressiva da Melanie Klein – a criança se dá conta de
que não é tão poderosa, onipotência.
A mãe é,
além do objeto que recebe, em certos momentos, a agressão da criança, é também
aquela que cuida dela e a protege. Quando
a criança exprime raiva e recebe amor, a criança confirma que a mãe sobreviveu
e é um ser separado dela. O bebê adquire a noção de que suas próprias pulsões
não são tão danosas e pode, pouco a pouco, aceitar a responsabilidade que
possui sobre elas.
Bleichmar e
Bleichmar (1992) dizem que simultaneamente a mãe que é agredida e a mãe que cuida vão se aproximando na mente do
indivíduo, que assim adquire a capacidade de se preocupar com seu bem-estar,
como objeto total. Isto constitui o grande sucesso que Winnicott
identifica como a última das etapas do desenvolvimento emocional primitivo.
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