As observações sobre o cuidado inadequado na primeira infância e o
desconforto e a ansiedade de crianças pequenas relativos à separação dos
cuidadores levaram o psiquiatra, especialista em psiquiatria infantil, e
psicanalista inglês John Bowlby (1907-1990) a estudar os efeitos do cuidado
materno sobre as crianças, em seus primeiros anos de vida. Bowlby impressionou-se
com as evidências de efeitos adversos ao desenvolvimento, atribuídos ao
rompimento na interação com a figura materna, na primeira infância.
Os estudos iniciais de J. Bowlby (1940; 1944), além dos trabalhos
de outros pesquisadores proeminentes que o influenciaram, deram origem às
primeiras formulações e aos pressupostos formais da Teoria do Apego (TA). Os
conceitos de Bowlby foram construídos com base nos campos da psicanálise,
biologia evolucionária, etologia, psicologia do desenvolvimento, ciências
cognitivas e teoria dos sistemas de controle (BOWLBY, 1989 ; BRETHERTON, 1992).
Bowlby buscou alternativas embasadas cientificamente para se defender dos
reducionismos teóricos, dando ênfase aos mecanismos de adaptação ao mundo real,
assim como às competências humanas e à ação do indivíduo em seu ambiente
(WATERS, HAMILTON & WEINFIELD, 2000).
O estudo de Mary Ainsworth (1963) sobre o apego investigou fatores
determinantes da proximidade intimidade expressa no comportamento de
interação de crianças com suas mães. Após a publicação do seu estudo, realizado
em Uganda, houve uma grande colaboração intelectual entre Ainsworth e Bowlby.
Assim, os trabalhos de M. Ainsworth (1978; 1985) sobre o
desenvolvimento socioemocional durante os primeiros anos de vida evidenciaram
que o modelo de apego que um indivíduo desenvolve durante a primeira infância é
profundamente influenciado pela maneira como os cuidadores primários (pais ou
pessoas substitutas) o tratam, além de estar ligado a fatores temperamentais e
genéticos.
M. Cortina & M. Marrone (2003) consideram que a TA organiza o
comportamento em termos de um sistema motivacional e que as idéias de Bowlby
representaram o ponto de partida para o desenvolvimento de uma nova teoria da
motivação humana, que integra aspectos da biologia moderna e inclui afeto,
cognição, sistemas de controle e de memória, além dos aspectos envolvidos no
desenvolvimento, sustentação e provimento dos laços de apego. Essa
consideração se baseia no fato de que a proposta dessa teoria organiza o
comportamento em termos de um sistema motivacional. Além disso, o movimento
individual de uma pessoa em direção a múltiplas outras converge para que a TA
também seja considerada uma teoria relacional das interações sociopsicológica.
Cortina & Marrone (2003) salientam ainda que a TA contempla os processos
normais de desenvolvimento e a psicopatologia humana, além de abordar os
prcessos de informação para a compreensão dos mecanismos psicológicos
utilizados na vivência de um trauma ou uma perda, ou, ainda, na experiência de negligência
ou rejeição pelas figuras de apego.
Assim, essa abordagem teórica oferece uma base para estudos sobre
os afetos e as emoções dos seres humanos, proporcionando um suporte empírico
coerente para a compreensão dos processos de desenvolvimento normal e
patológico, ao integrar aspectos da biologia moderna ao embasamento de seus
estudos.
Para J. Crowell & D. Treboux (1995), as pesquisas sobre a TA
vêm tomando diversas direções, examinando, por exemplo: a relação entre as
experiências de apego da infância e o comportamento parental; a transmissão
intergeneracional dos padrões de apego; o impacto das experiências de apego da
infância nos relacionamentos de adolescentes e adultos; o papel do apego entre
adultos, tanto na parentalidade, como nas relações românticas e em seus
pensamentos, percepções e comportamentos; as relações entre o apego da infância
e sua continuidade na adolescência; o apego entre o bebê e seu cuidador; e
analogias com as patologias e suas evoluções. Recentemente, pesquisas baseadas na
TA estão sendo desenvolvidas com interesse em eventos que ocorrem durante o
ciclo vital e que podem mudar o estilo de apego de um indivíduo (DAVILA, BURGE
& HAMMEN, 1997).
De acordo com J. Bowlby (1973/1984), o relacionamento da criança
com os pais é instaurado por um conjunto de sinais inatos do
bebê, que demandam proximidade. Com o passar do tempo, um
verdadeiro vínculo afetivo se desenvolve, garantido pelas capacidades
cognitivas e emocionais da criança, assim como pela consistência dos
procedimentos de cuidado, pela sensibilidade e responsividade dos cuidadores.
Por isso, um dos pressupostos básicos da TA é de que as
primeiras relações de apego, estabelecidas na infância, afetam o estilo de
apego do indivíduo ao longo de sua vida (BOWLBY, 1989).
Outro conceito fundamental da TA é o do comportamento de apego,
que se refere a ações de uma pessoa para alcançar ou manter proximidade com
outro indivíduo, claramente identificado e considerado como mais apto para
lidar com o mundo (BOWLBY, 1989; CASSIDY, 1999). A função principal atribuída a
esse comportamento é biológica e corresponde a uma necessidade de proteção e
segurança (BOWLBY, 1973/1984).
B. Golse (1998) ressalta que o comportamento de apego é
instintivo, evolui ao longo do ciclo da vida, e não é herdado; o que se herda é
o seu potencial ou o tipo de código genético que permite à espécie desenvolver
melhores resultados adaptativos, caracterizando sua evolução e preservação.
Evidências de que as crianças também se apegam a figuras
abusivas sugerem que o sistema do comportamento de apego não é conduzido apenas
por simples associações de prazer. Ou seja, as crianças desenvolvem o
comportamento quando seus cuidadores respondem às suas necessidades
fisiológicas, mas também quando não o fazem (CASSIDY, 1999).
Contudo, durante todo o ciclo vital, o comportamento de apego está
presente em variadas intensidades e formas. Pode ter formas ativas, como
procurar ou seguir o cuidador; formas aversivas, como chorar;
ou pode ainda aparecer sob forma e sinais comportamentais que
alertam o cuidador para o interesse de interação da criança, como sorrir e
verbalizar de modos diversos. Todas essas formas são observadas em crianças,
adolescentes e adultos ao buscarem a aproximação com outras pessoas. É o padrão
desses comportamentos, e não sua freqüência, que revela algo acerca da força ou
qualidade do apego (AINSWORTH, 1989).
J. Bowlby (1969/1990) distinguiu dois tipos de fatores que podem
interferir na ativação do sistema de comportamento do apego: aqueles relacionados
às condições físicas e temperamentais da criança, e os relacionados às
condições do ambiente. A interação desses dois fatores é complexa e depende, de
certa forma, da estimulação do sistema de apego. Além disso, esse sistema tem
função direta nas respostas afetivas e no desenvolvimento cognitivo, já que
envolve uma representação mental das figuras de apego, de si mesmo e do
ambiente, sendo estas baseadas na experiência.
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