quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

HEINZ KOHUT




HEINZ KOHUT 
(1913-1981) Criador da Escola chamada Psicologia do Self, com ênfase na normalidade e patologia dos transtornos narcisistas. Nascido em Viena, formou-se neurologista e psiquiatra e desenvolveu seu trabalho em Chicago. Postulou duas novas estruturas em relação ao self, ambas de formação arcaica: o self grandioso e a imago parental idealizada.

De acordo com Ramos (2001), que resume as descobertas de Kohut sobre o self, este self, restrito ao conteúdo do aparelho mental, possuía uma dinâmica própria que pertencia ao nível da experiência do self com o objeto.
“Kohut elaborou uma teoria para o self no sentido lato, ou seja, para a dinâmica vivenciada entre o self e o objeto. Assim, o self, se visto sob o ângulo de visão do sentido restrito, seria um conteúdo do aparelho psíquico (uma extensão da metapsicologia clássica); se visto sob o ângulo de visão do sentido lato seria diferenciado das três instâncias psíquicas (ego-id-superego), podendo-se examinar a sua gênese, o seu desenvolvimento e os seus componentes. É importante frisar que, ao diferenciar o self das três instâncias psíquicas, isto é feito apenas no contexto teórico. Na prática jamais poderia ser ignorado que o self é um conteúdo do aparelho.
Primeiramente, Kohut pensou os primórdios da formação do self como algo fragmentado que iria se aglutinando ao longo de seu desenvolvimento. Este modelo surgiu emparelhando o desenvolvimento do self com o desenvolvimento das zonas erógenas, ou seja, através da observação de que a criança inicialmente possuiria sensações isoladas de seu corpo e, também, de suas funções mentais. Ao longo do desenvolvimento, a criança iria aglutinando as partes do self, antes vivenciadas isoladamente, em um todo, formando uma noção globalizante e integrada de si mesma. Como um exemplo, a criança iria compreendendo que suas pernas fariam parte da mesma “engrenagem” que os seus braços, tórax, olhos, pensamento etc.
Posteriormente, reformulou esta visão da formação do self. Achava que não havia dados suficientes para afirmar que o self se estruturaria por aglutinação de partes. Isto porque Kohut propõe abrir mão da idéia de que o objeto de pesquisa da psicanálise esteja contido apenas no contexto do prazer e, assim, acrescentou ao objeto de pesquisa da psicanálise algo que denominou como “além do princípio do prazer: o self e as suas vicissitudes”.
No entanto, é importante esclarecer que este “além do princípio do prazer”, proposto para o self e as suas vicissitudes, nada tem a ver com o “além do princípio do prazer”, com o instinto de morte, proposto por Freud. O sentido empregado por Kohut diz respeito apenas a algo que estaria fora do contexto do prazer-desprazer, ou melhor dizendo, do âmbito das necessidades instintivas.
Assim, se o self possui um desenvolvimento fora do contexto das necessidades instintivas e se o self possui uma linha própria de desenvolvimento, Kohut propôs um desenvolvimento de estruturação do self diferente e independente da experiência que a criança possui de suas partes corporais e funções mentais isoladas. As partes experimentadas pela criança de suas experiências corporais e atividades mentais não formariam o self, mas se desenvolveriam dentro dele.
No entanto, Kohut nos aponta que a busca de prazer persiste sempre pela vida do indivíduo, paralela ao desenvolvimento do self.
“O aspecto de busca de prazer do mundo de experiência de nossa organização corpo-mente persiste pela vida afora: por um lado, torna-se o mundo das gratificações e dos prazeres inibidos em seu objetivo e, por outro, o mundo dos conflitos (estruturais) da tensão, da angústia e da culpa (...) Quando finalmente o self está bem-estabelecido, ele toma sua posição como estrutura superior, acima do mundo da experiência de partes e funções isoladas. Mas esse caminho de experiência continua a existir (...) Tanto no setor de suas ambições quanto no de seus ideais, o self não busca o prazer através da estimulação e da descarga de tensão; o self procura satisfação através da realização de suas ambições e de seus ideais nucleares. Sua satisfação não dá prazer, como acontece na satisfação do impulso instintivo, mas sim o triunfo e o brilho da alegria. E seu bloqueio não desperta o sinal de angústia (por exemplo, de angústia de castração - angústia pela perda do pênis, suprema fonte de prazer), mas o pressentimento do desespero (por exemplo, da vergonha ou da depressão vazia - desespero antecipado pelo esmagamento do self e pela derrota final de suas aspirações). O Homem Trágico não teme a morte como punição simbólica (castração) ; teme, sim, a morte prematura, morte que impede a realização dos objetivos de seu self nuclear. E, à diferença do Homem Culpado, o Homem Trágico aceita a morte como parte da curva de sua vida satisfeita e satisfatória”. (Ramos, 2001, p. 16)

Desenvolvimento do Self segundo Heinz Kohut

  Sem selfobjeto o bebê não se estrutura psicologicamente. Kohut assenta a sua construção teórica na observação empírica da relação self-selfobjeto e compara a importância do selfobjeto para a sobrevivência emocional da criança com a importância do oxigênio para a sobrevivência biológica do indivíduo. Nisto há concordância entre sua teoria e os teóricos do apego.

Se pensarmos, passo a passo, na importância para o desenvolvimento do self, do selfobjeto e do aparelho psíquico na formação de estruturas, podemos compreender que:
 1.   Inicialmente o bebê encontra-se em fusão com o selfobjeto. Este desempenha as funções ainda impossíveis para um bebê que não possui um self estruturado, mas apenas um núcleo de self.

2.   O selfobjeto idealizado exerce a função de atender à necessidade fundamental do bebê de se fusionar com um objeto onipotente, a fim de sentir-se amparado e seguro.
3. O selfobjeto especular exerce a função de espelhar o bebê atendendo à necessidade fundamental que a criança possui de sentir-se aceita e valorizada.
4.   O selfobjeto gemelar exerce a função de atender à necessidade fundamental que todo indivíduo possui de uma semelhança essencial, a fim de garantir à criança o sentimento de que ela pertencente a um contexto humano, onde se sente compreendida e é capaz de compreender o outro.
5.  Sabendo-se que é utópico um selfobjeto perfeito, podemos afirmar que este sempre irá falhar. Irá falhar no atendimento a uma ou mais das três necessidades básicas, acima citadas, existentes em todos os indivíduos.
6.  Para o desenvolvimento do self é importante que o aparelho psíquico esteja preparado para formar estruturas. As estruturas serão formadas em função da capacidade maturacional do aparelho psíquico associadas às experiências adequadas a cada fase do desenvolvimento do bebê.
7.  Se estas falhas acontecerem de acordo com a capacidade maturacional do aparelho psíquico serão chamadas de “falhas ideais”.
8.  Em conseqüência das falhas ideais, o aparelho psíquico do bebê, por uma questão psicoeconômica, irá retirar a catexia do objeto que falhou e, fragmentando os aspectos da imagem do objeto que está sendo internalizado, vivenciará o que Kohut chamou de “frustração ótima”.
9. O resultado da frustração ótima será a despersonalização dos aspectos da imagem do objeto internalizado que será, então, transformado em estrutura do self.
10. Mas, de acordo com as idéias de Kohut, entre a despersonalização do objeto internalizado e a estruturação do self, deverá ocorrer um processo que transforme os aspectos da imagem do selfobjeto internalizado em estrutura. A este processo transformador Kohut denominou de “internalização transmutadora”.
11. Assim, havendo falhas ideais por parte do selfobjeto e a experiência das frustrações ótimas por parte do bebê, este vai, por meio da internalização transmutadora,transformando a função antes exercida pelo selfobjeto em uma estrutura própria capaz de assistir a si mesmo.
A desidealização gradual e a internalização do selfobjeto é também o que possibilita a construção, na visão da psicologia psicanalítica do self, do superego.
Diante das falhas dos pais na fase pré-edipiana, a criança, desidealizando os mesmos, irá formar uma estrutura de self, pelo processo da internalização transmutadora. O investimento da libido objetal mistura-se com o investimento da libido narcísica e, assim, o processo de internalização dar-se-á sempre com o objetivo de investimento narcísico.
Quando um self não encontra no ambiente um selfobjeto empático, com falhas ideais, mas encontra um selfobjeto capaz de realizar falhas traumáticas, possibilitando uma desidealização abrupta, o self não pode ir se estruturando gradualmente pela internalização transmutadora.
Se pensarmos, passo a passo, nas conseqüências das falhas traumáticas como impedimento da formação de estrutura, podemos compreender que:
1.  O self inicialmente necessita apoiar-se em um selfobjeto (mantendo assim, a fusão dos instintos) para seguir o seu desenvolvimento;
2.  Se o selfobjeto falha traumaticamente, não respeitando a capacidade maturacional do aparelho psíquico (como exemplo: a morte do selfobjeto), o aparelho psíquico ao invés de desidealizar o selfobjeto que falhou abruptamente, o mantém internalizado de forma idealizada.
3.  Fica fácil compreendermos porque é mais econômico para o aparelho psíquico funcionar desta forma. O aparelho psíquico ainda precisa de um selfobjeto idealizado para sobreviver psicologicamente e, portanto, se o desidealizasse, quando ainda necessita da idealização, ocorreria sem dúvida a “morte” do self. Utilizando a analogia proposta por Kohut, podemos concluir que a desidealização abrupta corresponderia a falta repentina de oxigênio para o bebê respirar. Assim como não pode faltar oxigênio para a sobrevivência física do bebê, não pode faltar selfobjeto para a sua sobrevivência psicológica.
4. A desidealização abrupta promove a internalização de um objeto idealizado, reprimido para o inconsciente, contribuindo para a formação de um superego rígido e punitivo.
5.  Deste processo resultam certas patologias do self. O indivíduo permanece com um selfobjeto internalizado, incapaz, salvo através de uma análise, de transformá-lo em estrutura de self.
Em relação ao selfobjeto que falhou abruptamente à criança, esta, ao invés de desidealizá-lo, o internaliza idealizado. Isto porque, como já vimos, o self necessita apoiar-se em um selfobjeto idealizado para se desenvolver. Neste caso, a criança permanece, devido à internalização  de um selfobjeto arcaico, com um sentimento enorme de força e de grandiosidade, ou melhor dizendo, com uma onipotência extremada; e, ainda, permanece sempre dependente de um selfobjeto arcaico idealizado que fica impossibilitado, por não possuir mais correspondência no mundo externo, de uma transformação através da internalização  transmutadora. Em situações extremas são aqueles indivíduos que desenvolvem uma onipotência extremada, ao lado de um grande sentimento de desvalorização, além de uma forte propensão para a idealização, pois é o selfobjeto arcaico idealizado que contém todo o valor.
A gravidade destas estruturas defensivas na patologia do self irá variar de acordo com a etapa de desenvolvimento em que se encontrava o self do indivíduo, associada à quantidade de falhas não ideais ocorridas por parte do selfobjeto.
Como verificamos, Kohut baseou toda a sua construção teórica para o desenvolvimento do self na idéia de que a libido narcísica era capaz de catexizar os objetos mostrando-se, assim, um grande teórico das relações objetais. Kohut não concebeu a visão de um homem sem um objeto. Até mesmo para a relação narcísica, na visão de Kohut, faz-se necessário o objeto.


 Referências:
BLEICHMAR, N; BLEICHMAR, C. A psicanálise depois de Freud: Teoria e clínica. Porto Alegre: Artmed, 1992.

Vínculo Materno-Infantil E Participação Da Mãe Durante A Realização Da Punção Venosa: A Ótica Da Psicanálise
Júlia Peres Pinto
Vera Lúcia Barbosa
disponível em:
Heinz Kohut - Concepção de Self
disponível em:



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