Aspectos psicológicos e sociais
Desde muito cedo em seu desenvolvimento, muitas pessoas
constroem um projeto de vida: crescer, encontrar um par amoroso e com ele dar
início a uma nova família, e nesse contexto, diferentes motivações podem dar
origem ao desejo de ter um filho.
Desejar ter filhos mas se deparar com uma impossibilidade
nesse processo produz uma ampla gama de sentimentos, tais como medo, ansiedade,
tristeza, frustração, desvalia, vergonha, desencadeando por vezes quadros de
estresse importantes. A situação de infertilidade é capaz de
provocar efeitos devastadores tanto na esfera individual como conjugal e
desestabilizar as relações do sujeito com seu entorno social, podendo ocasionar
um decréscimo na qualidade de vida.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, estima-se
que entre 60 e 80 milhões de pessoas em todo o mundo enfrentem dificuldades
para levar acabo seu projeto de paternidade e maternidade em algum momento de
suas vidas e calcula-se que esse índice atinja aproximadamente 20% dos casais
em idade reprodutiva. No ano de 2000, aproximadamente de 5,0 a
6,3 milhões de mulheres nos Estados Unidos apresentaram problemas de infertilidade,
estimando-se para 2025 um incremento desse índice para 5,4 a 7,76 milhões (Klonoff-Cohen,
Chu, Natarajan & Sieber, 2001).
O processo reprodutivo humano é bastante complexo, sendo
estimado em 16,6% o resultado de gestação para um casal normal, após relação
sexual em período ovulatório. Isso prova que a fertilidade humana é baixa se
comparada a outras espécies. Considera-se infertilidade a falta de gravidez
após um ano de relações sexuais sem nenhum método de anticoncepção (Badalotti
& Petracco, 1997).
A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia
(FIGO) afirma que dentro do campo da saúde reprodutiva se encontram a
esterilidade e a infertilidade, que representam uma situação carencial que, se
não compromete a integridade física do indivíduo, pode incidir negativamente
no desenvolvimento da pessoa, do casal e ter efeito desestabilizador sobre a
personalidade. Estudiosos da aérea estão de acordo em admitir que a
infertilidade para os sujeitos que atravessam esta problemática é uma experiência
médica ou física - devido aos inúmeros procedimentos e exames aos quais são
submetidos, psicológica - pela intensidade de dificuldades de ordem emocional
desencadeadas, e social - uma vez que o convívio com a família, com casais com
filhos e as relações laborais muitas vezessofrem prejuízos. Essa experiência
por vezes requer a definição das identidades dos sujeitos como indivíduos e
como casal (McDaniel, Hepworth & Loherty, 1992). Para Ribeiro (2004), o
desejo de sermos pais como nossos pais floresce de nossa trama identificatória;
e os sentidos possíveis de ser homem e de ser mulher perpassam as funções
parentais. A capacidade de procriação parece ser um significativo
referencial da identidade de gênero, o qual diante do diagnóstico de infertilidade
exige um importante trabalho de elaboração psíquica para dar conta da possível
alteração no projeto de parentalidade. É imperativo se ter em conta a
transição desses casais de se verem esperançosos com a possibilidade da
gravidez para o reconhecimento de seus limites para atingi-la. Para os casais
que atravessam problemas de fertilidade, assim como para suas famílias, a
biologia da reprodução não é um processo fácil, direto e linear. Vai além da
escolha de um par amoroso, da interação sexual, da gravidez e do parto. A
infertilidade pode desencadear a revivescência de antigos traumas, perdas,
sentimentos de inadequação, ciúme, inveja, tudo dentro de um processo marcado
por longos períodos de interação com profissionais médicos que terminam por se envolver intimamente no sistema do casal.
Esses problemas advêm de um intenso estresse devido à não realização da
gravidez e das ilusões a ela relacionadas (Kusnetzoff, 1997).
Diante da perda ou da ameaça do poder de procriação,
muitas vezes não se distingue o que causa maior sofrimento: a ausência do filho
desejado ou os sentimentos de fracasso, de perda e de insegurança que invadem o
indivíduo nessa situação. A infertilidade é sentida e vivida como
um evento traumático para a maioria dos casais, sendo experienciada por eles
como o evento mais estressante de suas vidas (Klonoff-Cohen et al., 2001). A
pressão social e parental para a propagação do nome da família coloca um grande
peso sobre os casais inférteis (Monga, Alexandrescu & Katz, 2004).
O alto valor colocado na família motiva inúmeros casais a
se unirem. A inabilidade para realizar essa tarefa social coloca o casal que
não consegue conceber sob forte pressão. O conceito de si mesmo se vê
constituído sob a égide da desvalia e da incapacidade, chegando os indivíduos a
se verem como defeituosos (Seibel &
Carvalho, 1998).
A esterilidade tem sido considerada uma experiência de
dilaceração biográfica, caracterizada pelo sofrimento e pelos conflitos
pessoais vividos pelos homens e mulheres que atravessam essa situação (Bury, 1982).
A falta da concretização do projeto parental pode levar à ruptura do afeto
colocado nesse filho desejado (Hardy, 1998).
A experiência de infertilidade pode gerar culpa e
vergonha, muitas vezes produzindo um estigma social, que pode acarretar alienação
e isolamento. Uma acentuada queda na auto-estima,
carregada de sentimentos de inferioridade, é capaz de configurar quadros
importantes de depressão e de ansiedade elevada, podendo desencadear severas perturbações nas
esferas emocional, da sexualidade e dos relacionamentos conjugais. Se
considerarmos o conceito da OMS: “saúde é o estado de completo bem-estar
físico, mental e social, não se reduzindo a mera ausência de doença ou enfermidade”,
podemos dizer que a infertilidade é um grave problema de saúde em muitos
países em todo o mundo, pois incrementa severamente o sofrimento social
(Daar et al., 2002).
A construção do projeto parental mesmo antes da
concepção, o sujeito humano
tem no desejo de seus pais uma marca simbólica fundamental
para sua futura constituição. Partir do campo do desejo para marcar a origem da
vida significa sublinhar a transcendência da biologia quando trilhamos o campo
da constituição do humano, destacando sua dimensão subjetiva. A constituição
do desejo de maternidade e paternidade faz parte da cadeia simbólica
constitutiva da própria identidade do sujeito. Nascemos emaranhados numa
teia de desejos maternos e paternos (conscientes e inconscientes), carregando
as marcas de estarmos vinculados a uma trama simbólica, que transcende a
biologia, mas que por meio dela revela nosso pertencimento a uma família, a uma
geração, a um lugar no mundo. Diversas motivações se encontram presentes no desejo
de ter um filho, que pode ser a expressão de um ato criador e produtivo dentro
de um vínculo fecundo do casal; podendo constituir um dos destinos possíveis para
a realização da condição masculina e feminina. Segundo Freud (1914/1996),
desejos de imortalidade, de se aperfeiçoar através do filho, de realizar
antigos sonhos e projetos inalcançados podem se encontrar nas raízes do projeto
parental. Assim como o projeto de parentalidade está ligado a aspectos
saudáveis da vida de um indivíduo e de um casal, ele também pode ser buscado
como saída para resolução de conflitos. Por exemplo, um filho pode estar
sendo desejado para preencher lacunas na vida dos pais; para tentar salvar o
casamento; para evitar a solidão e até mesmo para atender à pressão cultural e familiar,
uma vez que filho é visto como um atributo de valor, potência e poder. O
contexto reprodutivo é formado na história de cada indivíduo a partir de uma
constelação de significantes inconscientes, de acontecimentos simbólicos, de
elementos imaginários e reais que caracterizam a singularidade e a
subjetividade da verdade de cada um. O fato de o desejo de maternidade e
paternidade estar intimamente relacionado com as vivências singulares de cada
sujeito indica que a experiência emocional da infertilidade igualmente terá um
caráter eminentemente singular. A teoria psicodinâmica em muito tem contribuído
para a compreensão dos conflitos vivenciados pelos casais inférteis, contudo as
pesquisas atuais realizadas nesse campo possuem referenciais teórico e
terapêutico diversos que devem ser considerados. Dentre os fenômenos que têm
merecido maior atenção por parte dos pesquisadores, encontram-se a ansiedade, a
depressão e o estresse.
RIBEIRO, Marina.
Infertilidade e reprodução assistida: desejando filhos na família
contemporânea. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.
Revista Brasileira de Ginecologia & Obstetrícia. Rio
de Janeiro: v.29, n.2, fev., 2007.
<Disponível em:>
http://pepsic.bvs-psi.org.br/pdf/epc/v23n4/v23n4a11.pdf
Infertilidade
Infertilidade é um distúrbio
ou condição do sistema reprodutivo masculino ou feminino que reduz a capacidade
de ter filhos. Um casal é considerado infértil quando não consegue conceber num
período de 12 a 18 meses, sem uso de métodos anticoncepcionais, mantendo
relações sexuais freqüentes. Nos
EUA, considera-se infértil o casal que não engravida após um ano de
relacionamento sexual sem contraceptivos.
As estatísticas mostram que
20% dos casais em idade fértil experimentam dificuldades para gerar filhos.
Pelo menos metade desse contingente precisará recorrer a tratamentos com
técnicas mais avançadas, como a fertilização in vitro. A chance de um casal
conceber por meios naturais, mantendo relações sexuais no dia fértil da mulher,
é de 20% ao mês. Com a reprodução assistida, a taxa de nascimentos pode chegar
a 55% por tentativa em mulheres de até 35 anos.
Definições importantes:
Infertilidade Primária: Infertilidade sem ocorrência de gravidez anterior.
Infertilidade Secundária: Quando já houve gravidez anterior.
Esterilidade: Quando não existe mais chance de gravidez. Embora
as palavras sejam empregadas como sinônimos, esterilidade é diferente de
infertilidade, que se caracteriza pela redução da capacidade de conceber. A
maioria dos casais que não tem filhos e enfrenta dificuldades para engravidar é
infértil e não estéril.
Infertilidade feminina
Principais fatores:
Idade
O decréscimo da fertilidade
com o passar do tempo é um fato biológico. A diminuição das chances de
engravidar ocorre em conseqüência das mudanças normais que acompanham o
envelhecimento. As mulheres nascem com um número limitado de óvulos e, como não
há formação de óvulos novos durante a vida, esse estoque cai progressivamente
com o tempo. Nos seus primeiros anos de maturidade reprodutiva, uma mulher tem
até 400 mil óvulos; aos 40 anos, o número já se reduziu a menos de 50 mil.
Quando chega à menopausa, cai quase a zero. Além disso, à medida que as
mulheres envelhecem, a qualidade de seus óvulos piora e eles passam a ter menor
capacidade de fecundação.
Alterações nas trompas
As obstruções nas trompas,
também chamadas de tubas, são provavelmente as campeãs na incidência de
infertilidade feminina. Podem ocorrer como seqüela de infecções e endometriose
ou serem provocadas intencionalmente por laqueadura. As trompas desempenham um
papel decisivo na fecundação, pois este é o local onde se dá o encontro do
óvulo com o espermatozóide. Após a fertilização, as trompas têm também a função
de conduzir o embrião recém-formado para o útero. Portanto, não pode haver
obstáculo no caminho, tanto para a chegada do espermatozóide até o óvulo quanto
para a jornada do embrião até a "casa" que hospedará seu
desenvolvimento durante a gestação.
Aderência pélvica
Inflamações resultantes de
infecções e cirurgias no peritônio - a capa muscular que envolve toda a
cavidade abdominal e comporta tanto o intestino e outros órgãos abdominais
quanto os órgãos reprodutores - podem se estender às trompas, provocando
aderências. Quando isso ocorre, elas "grudam" no peritônio e perdem a
mobilidade. Ficam impedidas de colher o óvulo maduro que, depois de liberado
pelo ovário, cai na cavidade abdominal. Quando a tuba não consegue recolhê-lo,
o óvulo se perde e é reabsorvido pelo organismo.
Fatores uterinos
O útero é um pequeno órgão
formado por músculos, dotado de uma fantástica elasticidade. Na gravidez ele é
capaz de aumentar muitas vezes suas dimensões normais. O endométrio, seu
revestimento interno, é preparado a cada ciclo menstrual para abrigar uma
gestação. Se ela não acontece, o endométrio é expelido em forma de menstruação.
Diversas alterações podem afetar a cavidade do útero, dificultando ou impedindo
a gravidez. A presença de miomas (tumores benignos da parede uterina) ou
pólipos (tecidos porosos que se desenvolvem no endométrio) pode causar
protuberâncias que impedem a fixação do embrião.
Fatores hormonais ou
ovulatórios
Distúrbios hormonais que
afetam a ovulação são relativamente comuns e o melhor exemplo é a ausência de
ovulação (anovulação). Ela ocorre quando os ovários não liberam óvulos por
falhas nos mecanismos hormonais que regulam o ciclo reprodutivo. Outro problema
freqüente é a deficiência do corpo lúteo, um tecido presente no óvulo
fertilizado, responsável pela nutrição do embrião e por manter a gravidez antes
que ele se fixe no útero. O corpo lúteo é encarregado também de promover o
cancelamento da menstruação, mas nem sempre produz os hormônios necessários à
realização dessa tarefa.
Endometriose
Uma das mais perversas
causas de infertilidade, acarreta problemas similares aos das aderências
pélvicas. É considerada uma doença dos tempos modernos, cuja incidência
aumenta ano a ano, principalmente em decorrência de estresse. A
endometriose se inicia quando, durante a menstruação, alguns fragmentos do
endométrio se desprendem do útero, passam pelas tubas e caem na cavidade
abdominal. Em condições normais, todo mês o sistema imunológico aciona um
mecanismo de varredura destinado a remover esse fragmentos que se desviaram do
caminho. Mas às vezes esse mecanismo deixa de funcionar e os fragmentos se
instalam em vários pontos do abdome, causando lesões, cistos e reações
inflamatórias que podem formar cicatrizes e aderências. A endometriose
dificulta a implantação do embrião no útero e aumenta as chances de abortament
Infertilidade Masculina
Principais fatores:
Infecções e inflamações
Quando atingem as vesículas
seminais ou a próstata - as glândulas responsáveis pela produção do líquido
seminal -podem alterar as características químicas do sêmen ou possibilitar a
ação direta de microorganismos sobre ele. Existe ainda o risco desses processos
se alastrarem para os testículos ou para os canais que transportam os
espermatozóides e o próprio líquido seminal. Seja qual for o caso, o efeito é o
mesmo: infecções e inflamações afetam a mobilidade dos espermatozóides, podendo
até imobiliza-los por completo. Além disso, podem obstruir os canais que
conduzem os espermatozóides, impedindo sua liberação
para o sistema genital feminino.
para o sistema genital feminino.
Alterações hormonais
Predisposição genética,
tumores, medicamentos - como os de controle da hipertensão - e certas doenças
podem alterar o equilíbrio hormonal masculino, com reflexos diretos sobre a
fertilidade. A baixa produção de testosterona, por exemplo, um dos problemas
mais comuns, reduz a produção de espermatozóides e afeta sua qualidade.
Quantidade e qualidade dos
espermatozóides
Diminuição da quantidade,
assim como alterações da qualidade ou da forma dos espermatozóides são
responsáveis por 90% dos casos de infertilidade masculina. Denomina-se
oligozoospermia a contagem de espermatozóides abaixo de 20 milhões/ml de sêmen.
Já a ausência de espermatozóide no sêmen é chamada de azoospermia.
Varicocele
Trata-se da formação de
varizes nas veias da região escrotal, onde estão alojados os testículos. As
dilatações dessas veias prejudicam o fluxo sanguíneo local, a troca de
nutrientes e levam ao acúmulo de substâncias tóxicas e ao aumento de
temperatura. Esses fatores produzem oligozoospermia - a diminuição do volume de
produção dos espermatozóides e de sua qualidade
Distúbios imunológicos
Em condições normais, os
espermatozóides permanecem confinados no interior dos testículos, sem contato
com a circulação sanguínea. Mas traumas, infecções ou vasectomia podem romper
esse isolamento, fazendo com que o próprio organismo, por identificá-los como
agentes externos, produza anticorpos para combater os espermatozóides.
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