INTRODUÇÃO
À OBRA DE FRANÇOISE DOLTO
Francoise
Dolto fazia parte do círculo de analistas de Jacques Lacan, onde
compartilhavam talento, carisma e um desgosto pelas instituições de rigidez
teóricas. O talento dela para a escuta da infância deu-se logo após defender
sua tese de medicina em 1939 sobre o tema das relações entre a psicanálise e
pediatria.
Dolto utilizou um método com as crianças que consistia em abandonar a técnica
da brincadeira e da interpretação dos desenhos e praticar uma escuta capaz de
traduzir a linguagem infantil. Segundo Dolto, o psicanalista devia usar as
mesmas palavras das crianças e comunicar-lhe os seus próprios pensamentos de
forma real.
Alguns temas específicos permearam toda sua obra. Sobre a linguagem e
comunicação ela dizia que o ser humano é um ser de “filiação linguajeira”, um
ser de linguagem pertencente a uma linhagem. O ser humano é um ser de
comunicação. A verdadeira relação única e simbólica é a relação da
fala. O lactente tem um desejo de
comunicação interpsíquica; a comunicação se origina no desejo. E o objeto de
desejo já existe desde as primeiras respirações do bebê.
A função paterna para Dolto é fundadora do ser humano. Essa função se
exerce no seio de uma relação inter-humana, dentro de um espaço triangular, ela
diz, “há que haver uma triangulação, para que o sujeito fale de si num eu
referido a um ele”.
Sobre a Castração dizia ser humanizante. Para ela, sem a proibição do incesto
não seríamos seres da linguagem. Castrações é uma provação, mas são também
promessas e experiências implantadoras: no mundo humano (castração umbilical),
na presença sexual (castração primária) e no mundo da cultura (proibição do
incesto e castração edípica). A renuncia a um objeto desejado, a um fazer até
então permitido, permite uma simbolização adjacente, um circuito mais elaborado
de comunicação.A proibição autoriza e dá frutos.
Considerou o Édipo como um movimento
pulsional, uma encruzilhada estrutural. A criança não pode ocupar, sem
prejuízo, o lugar do pai ou de um objeto erótico na economia libidinal da mãe.
Em Dolto, a psicopatologia da criança é apreendida numa resolução com todos
esses temas: segurança básica violentada, perda de ritmo, ausência de palavras
e trocas lúdicas, não-ditos, experiências vividas sem palavras explicativas,
castrações não impostas ou superadas, angústias e fixações neuróticas dos pais
e resolução difícil ou impossível do Édipo. As crianças, nos primórdios do
saber, devem ser respeitadas em suas características expressivas e em suas
fantasias. Deve-se reconhecê-las como sujeitos do desejo, de ouvi-las em sua
verdade, através de suas palavras e de seus sintomas. Esses sintomas são
mensagens a decodificar.
Dolto, ao criar a “boneca flor”(1949), integrou à sua prática a técnica dos
jogos e, embora não tivesse conhecimento, na época dos trabalhos de Melanie
Klein, referia-se de maneira sutil a uma clínica das relações de objeto.
Através dessa “boneca flor”, sairia a representação particular que Dolto faria
da imagem do corpo,mais próxima da concepção lacaniana do estádio do espelho.
Publicou, também, depois de
conturbados problemas que a impossibilitaram de ensinar, o material gráfico e
verbal, com suas intervenções e associações, do tratamento de um adolescente de
14 anos, “O Caso Dominique”.
No ano de 1979, Dolto criou em Paris a primeira “Casa Verde”( uma casa
intermediária entre o lar familiar e a creche ou a escola maternal), para
acolher crianças até a idade de três anos, acompanhadas dos pais. Segundo
Dolto, “trata-se de evitar os traumas que
marcam a entrada na pré-escola e de manter a segurança que a criança
adquiriu no nascimento”.
Através da sua força intuitiva, havia uma maneira particular de Dolto
compreender os eventos psíquicos. Para ela as crianças devem ser respeitadas em
suas características expressivas e em sua fantasia, cabendo aos psicanalistas
reconhecê-las como sujeitos desejantes e ver em seus sintomas mensagens a serem
decifradas que exprimem a singularidade de sua verdade e sua história.
Fontes:
Introdução
às obras de Freud, Ferenczi, Groddeck, Klein, Winnicott, Dolto, Lacan/ Sob a
direção de J-D Nasio, com as contribuições de A. – M. Arcangioli...[ET AL];
tradução, Vera Ribeiro, revisão marcos Comaru. Rio de Janeiro Jorge Zahar Ed.
1995.
<http://www.espacopsicanalitico.com.br/Dolto.htm>
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